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Sete projetos imperdíveis na SP-ARTE Rotas Brasileiras

Destacamos, entre os 70 projetos da feira, espaços que reconhecem e valorizam tudo que é popular, original e periférico 

por Beta Germano

Erika Verzutti
Erika Verzutti

Contagem regressiva para a abertura, entre os dias 30 de agosto a 03 de setembro, na ARCA, em São Paulo, da segunda edição da SP-ARTE Rotas Brasileiras. Entre os  70 projetos curados especialmente para a ocasião por galerias de todo o país, selecionamos alguns dos espaços mais especiais da feira e que buscam celebrar a diversidade e a riqueza da arte brasileira.  A palavra de ordem?  Reconhecer e valorizar tudo que é popular, original e periférico – desde as favelas das metrópoles até uma costa ameaçada pela indústria  petrolífera, passando por produções do sertão que foram, muitas vezes, invisibilizadas. 

Aniversario de 6 anos da Renatinha, de 1987, Retratistas do Morro, GDA - Galeria de Artistas
Aniversario de 6 anos da Renatinha, de 1987, Retratistas do Morro, GDA – Galeria de Artistas

1.Retratistas do Morro Galeria GDA


Vencedores da votação online do prêmio PIPA de 2023, os fotógrafos mineiros Afonso Pimenta e João Mendes, nomes responsáveis pelo projeto Retratistas do Morro, registraram, desde os anos 19960, da vida cotidiana e de eventos sociais da comunidade do Aglomerado da Serra, considerada a segunda maior favela do Brasil, em Belo Horizonte. 


Os registros quase despretensiosos, apresentadas na Galeria GDA, acompanham com intimidade a realidade familiar e seus movimentos cotidianos por meio de escolhas estéticas já reconhecíveis e marcam as mudanças nos cenários social, político, econômico e cultural ocorridas nas favelas do Brasil ao longo dos últimos quase 50 anos. Trata-se, portanto, de um  importante trabalho estético e sócio-cultural acaba por mapear a identidade e cultura dos habitantes da periferia, contribuindo para a construção de uma narrativa da história brasileira a partir das experiências e visões de mundo de seus próprios moradores das vilas, favelas e comunidades do país.


Como ressalta o  curador Guilherme Cunha,  com “o registro de uma realidade familiar e seus movimentos cotidianos, acompanhando intimamente o acontecimento de casamentos, nascimentos, batizados, jogos de futebol, velórios, formaturas e bailes, eles construíram uma iconografia inédita, das poucas ainda preservadas, em que é possível acessar mudanças nos cenários social, político, econômico e cultural ocorridas nas favelas do Brasil”. O projeto marca presença, também na coletiva “Dos Brasis”, no Sesc Belenzinho, e em individual no Sesc Pinheiros.

Meninas, Augusto César
Meninas, Augusto César, Sertão Negro

2.Quem são os outros artistas, além do Dalton Paula, do Sertão Negro    

Idealizado pelo artista visual Dalton Paula, e gerido pelo artista e por sua companheira, Ceiça Ferreira, o Sertão Negro Ateliê e Escola de Artes é um espaço artístico cultural quilombola de vivências e trocas em Goiânia. Criado em 2021, o  Sertão Negro apresenta trabalhos de 8 artistas residentes conectados pela ideia de  por “aterramento”  e das  noções de que a terra é sagrada e o corpo é força motriz nesse arranjo que concebe cura, fecunda e sustenta toda a sociedade. 


“O cheiro de terra molhada e os vestígios dela nas mãos quando se semeia, compõem o laço afetivo de uma ancestralidade que desbravou as matas, e teceram um percurso de início, meio e fim, mas que retorna”-  define o texto do projeto. Há em comum, aqui, um desejo de assentar novos enredos de re-existências por meio de fios complexos, ligados à terra e ao corpo, usados para tecer as histórias dos ancestrais dos artistas. Desta forma,  todos eles questionam as hierarquias e os poderes que inviabilizaram indivíduos diaspóricos, propondo novas formas de percepção de mundo. 


Abraão Veloso tece tranças que representam atos de cuidado e resistência, enquanto Augusto César retorna às memórias da casa de seus avós paternos, um lugar de estranhezas onde narra ver vultos de guras e sentir cheiros de podridão. Gabriela Chaves, por sua vez cria esculturas costuradas que rememoram dores e intimidades da mulheres, explorando encontros permeados por silêncios, reticências e pudores. Já Genor Sales se inspira ela ideia do “peixe fora d’água” para questionar acessos, violências e limitações impostas nas vidas das pessoas negras de origem periférica.

  Na série Ensaios sobre o prazer e a dor, lía vallejo desloca cenas de rituais católicos que podem ser interpretados como imagens eróticas para propor uma discussão sobre como as instituições cristãs são fundadas nas ideias de sexualidade,  dor e culpa. Vale reparar, ainda, na pintura “Olho de Coisa Ruim, Vai Secar Pimenteira e Não Vai Me Pegar”, de William Maia – cujo trabalho tem forte influência da cultura negra, especialmente por tradições populares e religiosas, mesclando elementos do sagrado e do profano. Na obra selecionada, ele retrata uma família negra em uma cena festiva, envolta por uma aura de devoção e proteção, transmitindo ideias de  alegria, fé e resistência e enfatizando a importância da família, comunidade e ancestralidade.

João Farkas
João Farkas


3.Projeto Costa Norte


João Farkas apresenta uma série de fotografias do projeto Costa Norte: ele percorreu 2.200 quilômetros, entre o Amapá e o Rio Grande do Norte, para documentar a região antes que “a sanha da ocupação desordenada a transformasse”, como relata o artista em matéria na Folha de São Paulo. A ideia? Chamar atenção para a chamada “costa equatorial”, atualmente ameaçada pela  exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas.

 
Na década de 1980, Farkas documentou por dez anos a saga da ocupação da Amazônia após a descoberta de ouro em Serra Pelada. Nessa mesma época, fotografou extensivamente a vida em Trancoso, vila de pescadores que foi completamente transformada pelo turismo intenso e a ocupação imobiliária.


Ao longo de três anos e seis expedições, Farkas registrou o cotidiano de ribeirinhos;  igarapés; manguezais; e, a fauna e flora mostrando o que pode ser destruído por causa de indústria  petrolífera – calcula-se que  existam mais de 30 bilhões de barris de óleo na costa. Sabemos que, provavelmente, o histórico de negligência se repetirá, mas o fotógrafo insiste em apostar no poder de uma imagem inusitada e hipinotizante.  Farkas se apropria de luzes e cores inusitadas ( mas reais), contastes, texturas e composições surpreendentes, flertando com o abstrato, para sensibilizar uma sociedade já anestesiada diante de imagens cada vez mais comuns.

Miguel dos Santos
Miguel dos Santos, na galeria Marco Zero

 
4.Arte Armorial e artistas do Sertão brasileiro na galeria Marco Zero 


A Galeria Marco Zero apresenta um projeto que reúne um diálogo entre artesanato, as narrativas populares e uma intensa relação com a natureza. Com curadoria de Cristiano Raimondi, a seleção apresenta artistas do Movimento Armorial cuja produção se inscreve nas artes visuais, tal como Ariano Suassuna, Miguel dos Santos e Gilvan Samico. Esses artistas se voltam às fantasias e estandartes das festas populares do Nordeste, às xilogravuras que tradicionalmente ilustram os folhetos de cordel e ao folclore regional. 


 Raimondi também selecionou artistas que conviveram com o movimento, mas cuja a produção não era associada ao projeto Armorial. As peças em cerâmica e pinturas de Francisco Brennand que reportam a figuras oníricas e naturais, além da emblemática série de pinturas de Montez Magno intitulada “Fachadas do Nordeste”.

Amadeo Luciano Lorenzato
Amadeo Luciano Lorenzato, na Gomide & Co


5. Lina Bo Bardi em diálogo com artistas populares na Gomide & Co


A Gomide & Co toma como ponto de partida a produção de Lina Bo Bardi realizada a partir do período em que a arquiteta morou em Salvador, quando atuou como diretora do MAM da Bahia, entre os anos de 1958 e 1963. 


Com formação moderna europeia e industrial, Lina se apaixonou pela produção artesanal brasileira. Exemplos notáveis dos frutos oriundos desse novo olhar são a icônica mostra “A Mão do Povo Brasileiro”, cuja primeira montagem se deu em 1969, no MASP, e esse ano será homenageada no MAM de São Paulo; e, a concepção do Sesc Pompeia, entre 1977 e 1982.


A Gomide & Co vai apresentar, em parceria com a Marcenaria Baraúna, uma série de móveis até então nunca comercializados de Lina Bo Bardi, em diálogo com trabalhos de nomes como Alfredo Volpi, Chico da Silva, Conceição dos Bugres, Francisco Brennand, Itamar Julião, Maria Lira Marques, Nilda Neves, entre outros.  Em comum, tais artistas compartilham um mesmo movimento: busca superar as distinções estabelecidas entre cultura popular e arte erudita, entre o espaço institucional e a pujante vida cultural do país. 

Erika Verzutti, na Fortes D'Aloia Gabriel
Erika Verzutti, na Fortes D’Aloia Gabriel


6. Erika Verzutti explora a cerâmica mexicana na Fortes D’Aloia Gabriel


Tantra, exposição de Erika Verzutti apresentada entre fevereiro e abril deste ano no Museo Experimental el Eco, na Cidade do Mexico, ganha nova configuração para a SP-Arte Rotas Brasileiras. A nova série, produzida inteiramente no México e inédito no Brasil, foi executada em colaboração com a Ceramica Suro, de Guadalajara, introduzindo o uso da cerâmica como um material novo no repertório da artista. 

A artista revela, assim,  duas famílias de obras. A primeira é composta de esculturas verticais que envolvem técnicas vernaculares:carambolas, romãs e berinjelas são concatenadas como contas numa linha imprimem um equilíbrio tênue e sugerem uma proliferação infinita. Verzutti alinha, assim, uma alusão clássica à colunas brancusianas ao emprego simbólico de moldes de frutas e vegetais – linguagem já característica ao trabalho da artista.  Já a segunda família compreende relevos de parede cujos arranjos formais individuais e composição coletiva sugerem propriedades visuais em trânsito, rimando correspondências parciais numa vibração rítmica.  As superfícies das obras de Verzutti, usualmente ásperas e riscadas, feitas em bronze, concreto ou papel maché, passam a apresentar, agora,  formas esmaltadas com contornos de acabamento brilhante e reflexivo. 

Perigrinação
Perigrinação dos fiéis da Igreja do Reino da Arte

7. Reza entre os fiéis da Igreja do Reino da Arte


A Igreja do Reino da Arte ou Anoiva,  fundada em 2017 no Rio de Janeiro, pelos artistas Edu de Barros e Maxwell Alexandre,  promove cultos de adoração à Altíssima Arte. A convite da SP-Arte Rotas Brasileiras, apresenta sua nova entidade, a Santa do Paoco, patrona da edificação artística. 


Recém canonizada no Rio de Janeiro, se apresenta por meio de uma obra inédita Lenticular Santa do Paoco, desenvolvida pelo artista Edu de Barros em co-criação com a artista Andy Villela. Para tal acontecimento, ocorrerá todo dia uma reza às 18h, na qual os fiéis e público presente participam ativamente dessa consagração. Além da obra, estarão disponíveis os santinhos com as orações, o tradicional mate santo,  camisetas e uma tiragem de 10 ex-votos de cera com a imagem da Santa feitas a partir da escultura original em madeira.

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