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Coletiva na SP Arte discute a relação arte e natureza

Mostra estabelece diálogos artistas renomados como Ernesto Neto, Joseph Beuys e Frans Krajcberg com teóricos e artistas ainda sem galeria

por Beta Germano
 Uýra Sodoma
Uýra Sodoma

“A tecnologia tem papel fundamental na preservação do meio ambiente e, consequentemente, é essencial para a nossa sobrevivência, desde a forma e a rapidez como nos comunicamos sobre o assunto até para o desenvolvimento de materiais alternativos. Eu acho, inclusive, que demoramos muito para entender como a tecnologia pode nos ajudar no processo de entendimento e preservação do meio ambiente”, pontua Ana Carolina Ralston, curadora da exposição Arte natureza: ressignificar para viver, que abre na próxima quarta-feira, dia 6 de abril, na SP Arte. 

Depois de apresentar a exposição Arte e tecnologia na edição passada da feira, Ralston apresenta um novo olhar para o mundo da arte que à primeira vista é oposto ao tema da natureza, mas ela explica como tudo está conectado. Literalmente, aliás. A base de sua pesquisa parte dos estudos do naturalista e explorador alemão Alexander von Humboldt, conhecido por propor as bases para o monitoramento geomagnético e meteorológico moderno.   Humboldt foi o  primeiro ocidental a compreender a natureza como uma entidade integrada e a descrever o fenômeno e a causa da mudança climática induzida pela humanidade, entre 1800 e 1831. 

Hugo Fortes
Hugo Fortes

“Humboldt apresenta dados como a temperatura, umidade e pressão atmosférica, estabelecendo relações entre a vegetação de diferentes áreas. Esta classificação revolucionou o entendimento da natureza que temos até os dias de hoje, dando-nos a noção atual do que é a ecologia: a ideia da natureza como organismo vivo”, explica Ralston.  É a partir dessa ideia de ecologia que a curadora escolheu as obras da mostra.

E foi também um alemão que fez uma das primeiras obras ecológicas da história da arte ocidental: em 1982 quando Joseph Beuys  plantou 7 mil carvalhos na pequena Kassel, durante a Documenta 7. Cada árvore foi plantada acompanhada por uma placa e pedras de basalto – tudo com a participação do público. Beuys não poderia faltar, portanto, em Arte natureza: ressignificar para viver: o visitante terá a oportunidade única de conferir uma vitrine com trabalhos do artista da década de 1980. 

Deco Adjiman
Deco Adjiman

Digo primeiro da “história da arte ocidental” porque são muitos os povos indígenas que já entendiam a natureza como uma entidade integrada antes de Beuys. Parece coerente e necessário, portanto, incluir trabalhos de artistas indígenas. Não perca de vista, portanto, a pintura inédita de Daiara Tukano e as foto-performances de Uýra Sodoma.  

Daiara_Tukano
Daiara Tukano

Vale lembrar que foi numa viagem pela América Latina que Humboldt teve a epifania que marcou sua trajetória e o rumo da ciência: ele escalava o Chimborazo, nos Andes, até então tido como o ponto mais alto do mundo, quando percebeu que tudo na natureza está ligado. Não à toa artista chilena Cecilia Vicuña, também de origem indígena, já falava sobre arte e ecologia ainda nos anos 1960, assim como a brasileira Regina Vater – a última também presente na exposição com o trabalho Cargo, onde ela denuncia o tráfico ilegal de animais. 

Imperdível também as esculturas de Frans Krajcberg, incansável ativista ecológico que veio para o Brasil fugindo da Segunda Guerra, e de Henrique Oliveira – escultor que ganhou notoriedade por “pintar” com lascas de madeira e criar formas orgânicas que desafiam os espaços expográficos. 

Paula Costa
Paula Costa

Outro destaque são as esculturas de Amelia Toledo, responsável pela criação de uma espécie de “concretismo ecológico”  e  uma obra inédita e belíssima de Ernesto Neto composta por pedras, esferas de crochê e folhas secas. Ambos os artistas dialogam com a Arte Povera, movimento artístico italiano culminado nos 1960 por um grupo de artistas que desafiavam o mercado de arte e adotavam materiais não-convencionais, orgânicos e, muitas vezes, precários como areia, pedras, jornais, cordas, feltro, terra e trapos – “povera” é uma palavra italiana que  significa “pobre” e o uso desses materiais tinha o objetivo de exprimir a poética da efemeridade, materialidade e espontaneidade. 

O intuito era, também,  “empobrecer” a obra e criticar a decadência da sociedade que se baseia no acúmulo de riquezas materiais. Trata-se, portanto, de uma crítica ao consumismo exagerado e dos processos industriais que marcavam a época – processos esses que têm impactos ecológicos graves e já foram previstos por Humboldt nos anos 1800s. 

Sonia Gomes
Sonia Gomes
MarianaPalma
Mariana Palma

Para finalizar, Ralston convidou Mariana Palma para montar uma instalação que dialoga com a arquitetura de Niemeyer e o parque do lado de fora do Pavilhão e Paula Costa para apresentar uma obra em formato de folha feita de couro ecológico.  Uma exposição urgente, pertinente e bela.

Luiz Zerbini
Luiz Zerbini

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