Os nomes por trás do especial 2022 rapidamente se deram conta de que seria impossível fazer uma antologia da música brasileira para caber em dois episódios, de uma hora cada um. Optaram então por atentar-se ao poder narrativo das canções escolhidas e sua representatividade. O resultado pode ser visto na HBO Max e, de quebra, com um episódio “extra” só com bastidores e entrevistas.
O centenário da Semana de 22 foi o gancho para promover encontros não apenas entre artistas de diferentes gerações mas também entre gêneros musicais aparentemente opostos — e é aí que mora a beleza do especial e o que o faz ser atemporal.
Para dar alguns exemplos, na primeira parte, Ato I, o espectador é arrebatado com parcerias entre Caetano Veloso e o jovem guarani Owerá, Késia e Leci Brandão e o Rap da Felicidade orquestrado e cantado por Ludmilla. No segundo ato, Emicida e Criolo se unem para cantar Construção; Gilberto Gil canta com Duda Beat e Elza Soares, com Renegado.
Todas as apresentações são acompanhadas de obras de artistas contemporâneos projetadas em um telão no palco. São pinturas de nomes como Arjan Martins, Denilson Baniwa, Camila Soato, Vânia Mignone e Antonio Obá. Segundo Daniela Thomas, diretora de arte do especial, na conversa entre música e imagem uma potencializa a outra.
O terceiro episódio, Um olhar de dentro, oferece imagens de bastidores e entrevistas com cantores, curadores e diretores envolvidos. São exibidos também trechos de músicas sendo declamadas como poesias pelos artistas.
Para Monique Gardenberg, criadora do especial e curadora ao lado de Hermano Vianna: “Entendi que a ideia independia de alguém específico para ficar de pé e que o mais legal seria uma união imensa da música brasileira pelo Brasil, que festejasse a força, a potência e a inventividade dela, e, ao mesmo tempo, nos lembrasse quem somos”.
Em determinado momento do terceiro episódio, Emicida comenta: “Embora hoje exista uma série de críticas a respeito da Semana de 22, e boa parte delas seja legítima, o salto que foi dado também precisa ser reconhecido. Até a fricção, até o desencontro produziu a necessidade de uma resposta, e, só por isso, o movimento continua merecendo reverência”.
A fala de Emicida traz um ponto importante e que leva a outras considerações: o mais interessante deste ano de efeméride talvez seja entender, sem anacronismos, como alguns conceitos desse movimento e seus desdobramentos podem nos ajudar a pensar e melhorar o Brasil de hoje.
Assim, quem sabe um dia a frase que lemos no início do segundo episódio (“se em algum lugar o Brasil se resolve, como perspectiva e como promessa do bom encontro, é na música”) possa se tornar realidade em outras esferas também.
Felipe Hirsch assina a direção com Lourenço Rebetez e Fernando Young é responsável pela direção de fotografia. A direção musical é de Liminha e Kassin, com regência de Jacques Morelenbaum.