O que acontece quando o autor da biografia mais aguardada sobre um dos pintores mais aclamados da modernidade falece antes de publicar o final de sua obra? Essa foi uma das perguntas que ocupou as mentes dos leitores, críticos e curadores com a morte do historiador John Richardson em 2019, meses após adoecer gravemente. O quarto e último volume de sua biografia sobre Pablo Picasso ainda não havia sido publicado.
Agora, o livro é lançado pela Knopf Publishing Group, a partir da versão na qual Richardson trabalhava semanalmente ao lado de Shelley Wanger, sua editora à ocasião do falecimento. Segundo Wanger, no entanto, à época o livro já estava essencialmente finalizado, restando pendentes somente ilustrações, notas e certas pesquisas complementares.
Foi assim que “A Life of Picasso: The Minotaur Years” chegou às lojas em novembro de 2021, concluindo, após 30 anos, a quadrilogia composta por “The Prodigy”, “The Cubist Rebel” e “The Triumphant Years”. Aclamada por público e crítica, a obra de Richardson recebeu reconhecimento por sua escrita, profundidade da pesquisa, apreciação das realizações do pintor e também pela honestidade ao retratá-lo também em seus defeitos.
Amigo pessoal de Picasso e sua família, Richardson conheceu figuras icônicas como Jean Cocteau – fator que, para Bernard Ruiz-Picasso, neto de Pablo, contribuiu para que sua visão ao retratar a vida e a obra do avô fosse mais ampla do que a da maioria dos biógrafos. “Ele tinha uma perspectiva muito maior do que todos estavam fazendo. Não eram somente os fatos, que podem ser meio enfadonhos. O que você tem é precisão e perspicácia”.
A proximidade com o artista e seu entorno deu a Richardson a possibilidade de recorrer a fontes como Dora Maar – poetisa, fotógrafa surrealista, amante do pintor entre 1935 e 1943 e inspiração para muitas de suas obras – e Paolo Picasso, filho de Pablo e sua esposa, a bailarina russa Olga Khokhlova. Sua escrita reflete a perspectiva de um insider, de acordo com Wanger – Richardson tinha grande familiaridade com a obra do artista e insights precisos sobre questões como a inspiração de Picasso para produzir determinadas obras.
O livro, que retrata a vida de Pablo Picasso entre 1933 e 1943, aborda aspectos de sua transformação enquanto artista, num período em que o pintor explorou a poesia surrealista, os desenhos mitológicos e produziu sua épica “Guernica”, que retrata o bombardeio da cidade de Basque por Itália e Alemanha na Guerra Civil Espanhola. “Minotaur Years” também traz diversas correspondências inéditas de Picasso, como as trocadas com sua esposa e com a poetisa Alice Rahon, também amante do pintor.
Richardson, além de historiador, também foi crítico, curador e biógrafo, e atuava desde 2008 como consultor na célebre galeria Gagosian, auxiliando na montagem de seis exibições de obras de Picasso ao articular museus, colecionadores e seu próprio acervo para trazer a público obras raramente vistas do pintor. As exibições entraram na listagem de Roberta Smith (The New York Times) das melhores mostras artísticas do século XXI.