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Novo clipe de FKA twigs celebra ativismo negro em torno da escultura de Kara Walker

Cantora britânica reúne personalidades negras notórias e dançarinos em torno da escultura Fons Americanus , na Tate Modern, que questiona as narrativas de poder e construção de monumentos

por Beta Germano
Fons Americanus, Kara Walker
Fons Americanus, Kara Walker

Novo videoclipe da cantora e dançarina FKA twigs,  que estreou na última terça-feira, é ambientado na Tate Modern e tem, como protagonista, uma obra de arte que gerou debate: trata-se da escultura de fonte gigante idealizada por Kara Walker, chamada Fons Americanus, instalada no museu em 2019.  

Fons Americanus apresenta uma história de origem da diáspora africana e coloca perguntas oportunas sobre o que é lembrado e o que é esquecido em monumentos públicos. é uma fonte que sobe de duas bacias ovais cheias de água. Figuras escultóricas ocupam essas bacias e quatro lados do pedestal central, entre tubarões, cordas para enforcamento, e água que jorra da figura no topo. Sua forma é inspirada no monumento Victoria Memorial em frente ao Buckingham Palace, projetado em 1901 e apresentado em 1911 para honrar as conquistas da Rainha Victoria. 

Ao invés de uma celebração ao império britânico, como na obra original,  o trabalho de Walker oferece uma poderosa crítica, invertendo a função usual de memoriais e questionando as narrativas de poder que eles apresentam – tema que tornou-se ainda mais atual a partir das manifestações do #blacklivesmatter a partir de junho de 2020 e segue em discussão até hoje, fazendo com que muitas esculturas públicas no mundo fossem revisadas, retiradas ou redesenhadas.  A fonte é uma alegoria ao livro O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência, de Paul Gilroy, explorando as histórias interconectadas da África, América e Europa por meio de fatos, ficção e fantasia. Usando água como tema-chave, a artista faz referência ao comércio transatlântico de escravos e as ambições, destinos e tragédias desses três continentes.

Fons Americanus, Kara Walker
Fons Americanus, Kara Walker

As figuras criadas para o monumento são derivadas de uma variedade de imagens e personagens históricos, literários e culturais – incluindo a pintura Slave Ship, idealizada por J.M.W. Turner em 1840; The Gulf Stream, pintado por Winslow Homer em 1899; e o famoso tubarão mergulhado em formol por Damien Hirst em 1991, obra intitulada The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living. A imagem de propaganda dos escravos no século XIX foi uma fonte particular de inspiração, ao lado de outras cenas como a da deusa Vênus em pé em uma concha – eternizada por Sandro Botticelli em O Nascimento de Vênus. Na versão de Walker, no entanto, Vênus é reformulada como sacerdotisa das religiões de matriz africana e está  orgulhosamente no topo da fonte. Sua concha recortada aparece como uma pequena segunda escultura localizada na frente da ponte, de onde emerge o rosto de um menino chorando e enchendo a concha com suas lágrimas. 

Embora muitos críticos tenham elogiado o trabalho, chamando-o de uma meditação poderosa sobre o papel dos monumentos hoje, o Fons Americanus também teve seus detratores. Entre eles estava a crítica Rianna Jade Parker. Ela escreveu que Walker, que é americana, não fez o suficiente para considerar a própria conexão de Tate com o comércio de escravos e que um artista negro britânico poderia ter sido mais adequado para criar a obra.

Fons Americanus, Kara Walker
Fons Americanus, Kara Walker

A música, feita com  Fred Again e Headie On, chama-se Don’t Judge Me e parece ter sido uma resposta dos músicos ingleses à artista americana num movimento de cumplicidade e celebração do ativismo negro. No Instagram, FKA twigs escreveu , “Estou tão orgulhosa de lançar ‘Don Don’t Judge Me’ neste mundo. Este projeto é muito pessoal e especial para mim e foi uma honra filmar com a fonte dos Kara Walkers explorando a interconexão da história negra entre a África, a América e a Europa”.

Fons Americanus, Kara Walker
Fons Americanus, Kara Walker

No vídeo FKA twigs, os dançarinos se contorcem ao redor da escultura como se estivessem sendo puxados e puxados por forças invisíveis. Entre eles, estão vários homens e mulheres negros britânicos notáveis, incluindo os poetas Benjamin Zephaniah e Solomon O B; o jogador de futebol Mahlon Romeo; a treinadora Efua Baker; a modelo Munroe Bergdorf; a empresária Nicole Crentsil; a apresentadora Clara Amfo; a ativista Nicole Crentsil; a artista Lisa Elde; e, Reni Eddo-Lodge, autora do livro Why I’m No Longer Talking To White People About Race e primeira negra a chegar ao topo da lista dos mais vendidos do Reino Unido. 

Fons Americanus, Kara Walker
Fons Americanus, Kara Walker

Enquanto isso, FKA twigs senta numa sala sozinha. Ela dança alternando movimentos fluidos e secos em direção à saída, mas toda vez que se afasta muito de seu assento, ela é puxada de volta para sua cadeira. A coreografia representa a “luta contra um opressor invisível”. O final é soco no estômago sobre realidade: FKA twigs é “empurrada” mais uma vez para a sua cadeira, enquanto um personagem é violentado pela força oculta. Esta imagem é intercalada com cenas dos escravos da esculturas e, no final, o personagem é encostado na parede com as mãos para trás. No som, barulho de rádio como se fossem policiais em suas rotinas diárias. Uma clara referência aos abusos e pré-julgamentos contra as pessoas negras por parte da polícia como um reflexo da escravidão. Algo que infelizmente ainda é bastante comum não só na Inglaterra, mas no mundo inteiro. Com mais de 12 metros de altura, Fons Americanus estará na Turbine Hall da Tate até 7 de fevereiro (depois disso, seus materiais serão reciclados). FKA twigs  divide o crédito na direção do vídeo com Emmanuel Adjei, que trabalhou no álbum visual de Beyoncé, Black Is King.

Fons Americanus, Kara Walker
Fons Americanus, Kara Walker

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