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Exposição no Sesc desafia conceito de modernidade paulistocêntrica

Megaexposição ‘Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil’ abre no Sesc 24 de Maio com 600 obras de 200 artistas

por Gabriela Valdanha

Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil chega para desmontar a ideia de que o movimento envolvendo a Semana de Arte Moderna de 1922 começou a terminou em São Paulo em fevereiro daquele ano. A exposição abre no próximo dia 16 de fevereiro, no Sesc 24 de Maio, e fica em cartaz até 7 de agosto. A curadoria é de Aldrin Figueiredo, Clarissa Diniz, Divino Sobral, Marcelo Campos, Paula Ramos e Raphael Fonseca com consultoria de Fernanda Pitta. O objetivo é refletir criticamente sobre o centenário da Semana de Arte Moderna e o bicentenário da Independência, analisando-as em contextos históricos sobre a modernização do território brasileiro e explorando o que simbolizaram no passado e o que podem significar para o presente e para o futuro.

Vai também para a Amazônia, 1943, Jean-Pierre Chabloz, Coleção Jean Pierre Chabloz, Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará
Vai também para a Amazônia, 1943, Jean-Pierre Chabloz, Coleção Jean Pierre Chabloz, Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará

Segundo o material de divulgação, “ao articular a noção de modernidade com o território brasileiro, a exposição pretende repensar a centralidade do evento de 1922 que ficou marcado na história da arte no país, a partir de uma ampliação não apenas cronológica, mas também geográfica. Trata-se de um projeto que deseja mostrar ao público que a arte moderna já era discutida por muitos artistas, intelectuais e instituições de Norte a Sul do país, desde o final do século 19 até meados do século 20”.

Para tanto, as cerca de 600 obras de 200 artistas estarão divididas em quatro núcleos: Deixa Falar, Centauros Iconoclastas, Eu Vou Reunir, Eu Vou Guarnecer e Vândalos do Apocalipse. Estarão por lá nomes como Lídia Baís, Mestre Zumba, Genaro de Carvalho, Anita Malfatti, Tomie Ohtake, Raimundo Cela, Pagu, Alberto da Veiga Guignard, Rubem Valentim, Tarsila do Amaral e Mestre Vitalino. O interessante é que além de desenhos, pinturas e esculturas, a exposição irá reunir fotografias, revistas ilustradas, música e documentos históricos.

Raio-que-o-parta integra o projeto do Sesc São Paulo chamado Diversos 22 – Projetos, Memórias, Conexões em celebração ao centenário da Semana de Arte Moderna e ao bicentenário da Independência, e cujo objetivo é discutir, aprofundar, ressignificar os eventos passados em face dos desafios do presente.  

Bornal do cangaceiro Português, com caixa da farmácia acoplada 1938, autor desconhecido. Coleção Frederico Pernambucano
Bornal do cangaceiro Português, com caixa da farmácia acoplada 1938, autor desconhecido, Coleção Frederico Pernambucano
Dançando o samba na Festa da Ribeira, circa 1950, Voltaire Fraga, Galeria Roberto Alban
Dançando o samba na Festa da Ribeira, circa 1950, Voltaire Fraga, Galeria Roberto Alban

O título curioso vem de um estilo arquitetônico encontrado em fachadas de casas antigas de Belém (PA). A justaposição de azulejos quebrados formando desenhos geométricos, angulados e coloridos, que lembram setas, bumerangues e raios são conhecidos como “raio-que-o-parta”. O modismo desta arquitetura não se restringiu às elites locais da década de 1950, sendo logo apropriado por outras camadas da sociedade que popularizaram as fachadas raio-que-o-parta pelos bairros daquela cidade, como forma de modernizar o que era considerado obsoleto nas artes. 

“A mostra, portanto, leva ao público a certeza de que a noção de arte moderna, no Brasil, é tão diversa quanto as múltiplas culturas, sotaques e narrativas que compõem um país de dimensão continental”, afirma o press release.  

Deixa Falar

Por um lado, a presença de personagens e manifestações advindas dos povos originários, afro-brasileiros e minorias imigrantes foi central na criação de uma ideia de arte moderna. Por outro, figurou muitas vezes pelo olhar de uma elite que observava o povo, silenciando seus lugares de fala, além de destruírem seus locais de resistência, como florestas, aldeamentos, quilombos e cortiços, com o pretexto de impulsionar uma ideia equivocada de modernidade. Neste espaço, o público encontra obras de artistas afro-brasileiros, como Mestre Zumba, Agnaldo Manoel dos Santos e Wilson Tibério. 

Autorretrato, 1941, Wilson Tibério, Pinacoteca Barão de Santo Ângelo - Instituto de Artes - UFRGS
Autorretrato, 1941, Wilson Tibério, Pinacoteca Barão de Santo Ângelo – Instituto de Artes – UFRGS

Centauros Iconoclastas

O nome refere-se ao grupo literário de mesmo nome, fundado em Recife durante a década de 1920. Em um processo de aproximação entre arte e loucura, alguns artistas criticavam a normatividade de uma forma supostamente correta de ser, reivindicando a radical diversidade das existências. Este núcleo traz obras de Pagu, Lídia Baís, Aurora Cursino dos Santos, Tarsila do Amaral, Joaquim do Rego Monteiro, Moacir Andrade, Nelson Boeira Faedrich e outros. 

América do Sul I, 1927, Joaquim do Rego Monteiro, Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães - MAMAM
América do Sul I, 1927, Joaquim do Rego Monteiro, Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães – MAMAM
Sem título, sem data, Aurora Cursino dos Santos, Coleção Museu de Arte Osório Cesar. Cortesia Complexo Hospitalar do Juquery e Prefeitura Municipal de Franco da Rocha
Sem título, sem data, Aurora Cursino dos Santos, Coleção Museu de Arte Osório Cesar, Cortesia Complexo Hospitalar do Juquery e Prefeitura Municipal de Franco da Rocha

Eu vou Reunir, Eu vou Guarnecer

Referente à festa como espaço de liberdade e a primeira janela do modernismo. A ideia de reunir e formar grupos é a segunda vereda dos modernos. “Eu vou reunir, eu vou guarnecer, meu boi vai rolar no terreiro”, dizem os versos de uma toada antiga do bumba-meu-boi, no norte do país. Artistas que buscavam uma autonomia criadora em romances e telas viram em brincantes, por meio de brincadeiras e cordões populares, o caminho do novo, do sentimento de identidade da aldeia e da metrópole. Neste núcleo, obras de Dimitri Ismailovitch, Djanira, Heitor dos Prazeres, DJ Oliveira, Franklin Cascaes, Eros Volúsia, Rubem Valentim, Lasar Segall e outros artistas expõem o contexto desta festa entrelaçada à melancolia. 

Vândalos do Apocalipse

O título do último núcleo faz referência ao grupo literário formado por escritores paraenses, como Bruno de Menezes, Luiz Teixeira Gomes (Jacques Flores) e Clóvis de Gusmão que criticavam os discursos de atualização e os parâmetros de progresso e desenvolvimento vigentes no país a partir de 1921. A chegada do então “progresso” promoveu a destruição da natureza e dos modos de vida tradicionais, além de contribuir com o aumento da classe dos sem-teto, por conta da expulsão dos trabalhadores rurais de seus locais de origem. Neste núcleo, que reconta e retoma as discussões sobre a verdadeira identidade nacional brasileira, engendrada na tradição colonial e na modernização territorial, estão as obras de José Antônio da Silva, Hildegrand Rosenthal, Alice Brill, Frei Cândido Penso, Branco e Silva, dentre outros nomes nacionais.

Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil

Data: 16 de fevereiro a 7 de agosto 

Local: Sesc 24 de Maio 

Endereço: Rua 24 de Maio, 109

Funcionamento: terça a sábado, das 10h às 20h; domingo e feriado, das 10h às 18h

Ingresso: grátis (maiores de 12 anos deverão apresentar comprovante de vacinação contra Covid-19, físico ou digital) 

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