Sandra Gamarra apresenta obras inéditas no Brasil, na Galeria Leme

Com abertura hoje, dia 23 de novembro, a exposição traz obras da artista peruana que critica a permanência de relações e imaginários coloniais na atualidade

por Giovana Nacca
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Sandra Gamarra
Cuando las papas queman, 2021, Sandra Gamarra

A Galeria Leme inaugura hoje, dia 23 de novembro, a exposição En vías de desarrollo (Em desenvolvimento), individual da prestigiosa artista peruana Sandra Gamarra.

Em seu conjunto de trabalhos, assim como nas obras desta exposição, Gamarra apresenta uma perspectiva crítica à permanência de relações e imaginários coloniais na atualidade. As três séries que compõem esta mostra exploram as diferentes concepções de mundo que coexistem nas Américas. “Nos países denominados em desenvolvimento, parece coexistir duas concepções acerca da Terra: uma que a compreende como um sujeito de direitos e outra que a compreende como um objeto através do qual se obtém direitos”, comenta a artista.

A série que dá título à exposição, consiste em 10 releituras de obras de Albert Eckhout. Nelas, os retratos e naturezas-mortas são pintados com óxido de ferro, conferindo tons terrosos à composição. Alguns detalhes, como os pés e mãos das figuras humanas, são feitos com tinta a óleo, sugerindo se tratarem de obras inacabadas.

Albert Eckhout foi um importante pintor holandês, que permaneceu por sete anos no Brasil, durante a ocupação holandesa no século XVI. A serviço do conde Maurício de Nassau, Eckhout documentou o “Novo Mundo” através de desenhos e pinturas. Suas obras foram consideradas durante muito tempo documentos oficiais, uma representação fiel da realidade brasileira.

Sandra Gamarra
En vías de desarrollo V, 2022, Sandra Gamarra

É este caráter documental que Gamarra tensiona em suas releituras. Ao aplicar diferentes tratamentos à tela – ora detalhes a óleo, ora manchas avermelhadas – a artista retira a veracidade que outrora fora concedida a estas imagens e as coloca em questão. O gesto da artista denuncia o desenvolvimento e o progresso como narrativas, construções sociais, que ao serem apresentadas como sinônimos da verdade, escondem concepções de mundo.

Na série Cuando las papas queman (Quando as batatas queimam), Gamarra pinta batatas sobre reproduções de desenhos da obra Primera Nueva Crónica y Buen Gobierno (Primeira Nova Crônica e Bom Governo), escrita pelo peruano indígena Felipe Guamán Poma de Ayala, no início do século XVI. Ambos elementos utilizados pela artista tratam da relação entre o Peru e a Espanha. Na obra de Ayala, o escritor contempla a história antiga andina, a ascensão do Império Inca, a invasão espanhola e o início do período colonial a partir da perspectiva indígena. A publicação foi dedicada ao rei Filipe III com o intuito de trazer melhorias para a população ao narrar violências cometidas pela coroa. Já as batatas se tornaram um símbolo do intercâmbio cultural entre a Espanha e o Peru após a colonização.

No Peru é possível encontrar mais de 4.000 espécies de batatas, que variam de cores, formatos e nutrientes, de acordo com o local e o período de seu cultivo. Essa diversidade é fruto da sabedoria milenar dos povos andinos no cultivo do alimento. Assim, o retrato da variedade de batatas de Gamarra, parece uma alegoria do conhecimento andino e não mais do intercâmbio cultural, ao passo que os desenhos de Ayala refutam uma troca cultural amistosa, como se quer naturalizar.

Gradación (Gradação) é uma série de ponchos esticados em chassis como se fossem pinturas. A variação cromática cria uma gradação do bege ao preto passando por tons amarronzados e vermelhos, que remetem a coloração da pele humana e a diferentes tipos de solos.

Sandra Gamarra
Gradación, 2022, Sandra Gamarra

“Contam que o poncho vem do plantar, a cavidade por onde se insere a cabeça é uma referência ao buraco feito na terra para semear. O rasgo no centro da tela lembra também obras modernistas, como as de Lucio Fontana. O mesmo gesto remete a duas ideias contrapostas: uma apela aos ciclos da terra, ao conhecimento ancestral, outra a novidade, a nossa eterna aspiração por um começo”, comenta a artista.

Serviço 

En vías de desarrollo

Local: Galeria Leme
Endereço: Rua Valdemar Ferreira, 130 – Butantã, São Paulo – SP
Data: De 23 de novembro até 14 de janeiro de 2023.
Funcionamento: De terça a sexta, das 10h às 19h. Sábados, das 10h às 17h.
Ingresso: Grátis

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