Qual são as diferenças ( ou as semelhanças) entre o homem e o animal? Quem visitar a exposição Francis Bacon: Man and Beast, em cartaz no Royal Academy of Arts, de Londres, certamente sairá com essa pergunta e possíveis respostas na cabeça. A mostra traz uma coletânea de pinturas de um dos mais renomados artistas da Inglaterra que retratam a atração de Bacon pelas formas animalescas, marcado seu estilo próprio que rompeu com a abordagem da arte figurativa das vanguardas.
A técnica representativa de Bacon impressiona ao deixar pouco nítida a linha que separa a figura humana da animal, por vezes marcando traços de animalidade na figura humana ao retratar, por exemplo, um cachorro como a própria sombra de seu dono ou a sombra de um homem como um animal independente, não identificável.
Trata-se de uma zona de indiscernibilidade entre o humano e o animal – o que, para Gilles Deleuze, em sua análise da obra de Francis Bacon em Lógica da Sensação, não se trata uma questão de combinar formas, mas de retratar a forma comum entre o homem e o animal. O meio dessa identificação seria a própria carne – objeto de retenção do sofrimento e da vulnerabilidade retratadas nas pinturas de Bacon.
Bacon também acreditava na observação dos movimentos e comportamentos dos animais como instrumento para a compreensão mais profunda da natureza humana. Isso o levava a ter por hábito realizar viagens para observar animais em seu habitat natural na África do Sul, e utilizar fotografias do inglês Eadweard Muybridge, retratando humanos e animais em movimento, como referência constante.
O vínculo entre a figura humana e a animal é tão forte em Bacon que, em uma das entrevistas que concedeu para David Sylvester – reunidas em seu livro The Brutality of Fact – Interviews with Francis Bacon -, o artista afirmou:
“É claro que somos carne, somos carcassas em potencial. Quando entro em um açougue, eu sempre acho surpreendente eu não estar lá no lugar do animal”.
A exibição mostra a preocupação de Francis Bacon em retratar e estabelecer uma conexão entre os movimentos humanos e animais, indícios da bestialidade naquilo que é humano. Dando um caráter enigmático e brutal a esses corpos, mas que induz a um sentimento de piedade através da familiaridade, Bacon assim chama atenção para o grau de violência e sofrimento inescapável e impresso na carne dos seres moventes.