Fevereiro marca o início oficial da temporada no circuito das artes, e São Paulo já começa a esquentar com a abertura de várias exposições ao longo do mês. Separamos alguns dos principais destaques para acompanhar esse ritmo. “Indomináveis Presenças” ocupa o CCBB com 114 obras que deslocam narrativas marginalizadas, enquanto a Fortes D’Aloia & Gabriel inaugura a individual de Lucia Laguna, marcando seu retorno à cidade desde sua última mostra na galeria, em 2020.
Outra grande expectativa é a tão aguardada individual de Zanele Muholi no IMS Paulista, sua primeira no Brasil. A exposição reunirá um conjunto de mais de 100 obras, incluindo trabalhos inéditos produzidos no país. No dia da abertura, a artista participará de uma conversa com o público e de uma sessão de autógrafos.
No campo das investigações pictóricas, “Inner World”, de Vojtěch Kovařík, na Mendes Wood DM, distorce corpos heroicos até a caricatura, enquanto “S2S2S2”, primeira individual de Hiram Latorre na Martins&Montero, amplia sua pesquisa entre arquitetura e pintura. Já na Nara Roesler, “Cosmos – Outras Cartografias” revisita o mapa como ferramenta de poder.
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“Indomináveis Presenças” | CCBB
05.02 – 07.04
Idealizada pela AfrontArt, com curadoria de Luana Kayodê e participação de Cíntia Guedes como curadora convidada, “Indomináveis Presenças” reúne 16 artistas para deslocar narrativas e afirmar presenças historicamente marginalizadas nas artes brasileiras. A exposição, que apresenta 114 obras em linguagens diversas — da fotografia à escultura, do ritual performático à inteligência artificial —, amplia a percepção sobre identidade, ancestralidade e pertencimento. O diálogo entre corpo e memória atravessa as investigações de Adu Santos, que questiona ausências no discurso museológico, e de Emerson Rocha, que dá forma ao cotidiano negro e periférico sem reduzi-lo a estereótipos. A mostra também reúne nomes como Rafa Bqueer, Uyra Sodoma, Gê Viana, Mayara Ferrão e Rafaela Kennedy, entre outros.
“Cosmos – Outras Cartografias” + “A Cor entre Linhas” | Nara Roesler
06.02 – 15.03
Com curadoria de Laura Vinci em colaboração com o núcleo curatorial da galeria, a mostra reúne 20 artistas de diferentes gerações e nacionalidades, e propõe uma leitura expandida da cartografia, entendida não apenas como representação gráfica do espaço, mas como ferramenta de poder, construção simbólica e território de disputa. Se, por um lado, artistas como Nelson Leirner, Paulo Bruscky e Anna Bella Geiger abordam a cartografia por sua dimensão poética e suas implicações geopolíticas, por outro, André Vargas, Marina Camargo e Carlos Bunga exploram a materialidade dos mapas em suportes inusitados, como borracha e tecido.
Simultaneamente a galeria também abre a exposição “A Cor entre Linhas”, que investiga as interações entre cor e linha nas obras de artistas como Abraham Palatnik, Tomie Ohtake, Mira Schendel e Artur Lescher, cuja instalação inédita “Entrelinhas” (2025) serve como ponto de partida para a mostra.
Felipe Pantone, “Movimento e Transformação no Tecnoceno” + Ding Musa, “Todo olhar é político” | Galeria Raquel Arnaud
06.02 – 20.03
A Galeria Raquel Arnaud abre sua programação de 2025 com duas exposições simultâneas que abordam transformação e percepção sob diferentes prismas. No primeiro andar, “Movimento e Transformação no Tecnoceno”, primeira individual de Felipe Pantone no Brasil, traduz a fusão entre o analógico e o digital em composições geométricas, gradientes intensos e padrões ópticos que questionam o impacto da tecnologia na percepção e na experiência sensorial. No térreo, “Todo olhar é político”, de Ding Musa, expande sua pesquisa em fotografia para discutir o impacto humano no meio ambiente por meio de imagens abstratas e instalações que tensionam a relação entre arte e ecologia.
Lucia Laguna, “A propósito de duas janelas” | Fortes D’Aloia & Gabriel
08.02 – 22.03
“A propósito de duas janelas” marca o retorno da artista a São Paulo após quatro anos. A janela, elemento recorrente em sua prática, segue como estrutura e desvio: organiza a composição em retângulos e quadrados, mas também desestabiliza escalas e introduz novas possibilidades visuais. As pinturas recentes mostram uma mudança significativa – a artista deixou o ateliê onde trabalhou por mais de quatro décadas, e esse deslocamento físico reverbera na forma e no tema de suas obras. O entrelaçamento de vegetação e arquitetura reforça o caráter palimpséstico de sua pintura, onde muros, cabos e casas se fundem a densos emaranhados de mata, voltando o olhar para a paisagem urbana do Rio de Janeiro.
“Calambur” + instalação “dentro de fora de dentro” de Ava Rocha | Millan
08.02 – 22.03
“Calambur” é um projeto concebido por Guga Szabzon, Thomaz Rosa e o curador Cristiano Raimondi, que propõe um jogo visual e conceitual entre as práticas dos dois artistas. O encontro surge de um ano de colaboração, durante o qual compartilharam imagens de referência, frequentaram os ateliês um do outro e desenvolveram obras em conjunto, como “Só não sei se continuo” (2024), em que Rosa pintou sobre feltro — material recorrente na obra de Szabzon — a sombra projetada pelo corpo de ambos. O título da exposição, que remete a um jogo linguístico baseado na aproximação de palavras de significados distintos, traz à tona o diálogo construído ao longo do processo.
Além da mostra, Ava Rocha expande sua prática multidisciplinar com uma instalação que transforma o espaço expositivo em um território onírico e aberto ao inesperado, com performance inaugural no dia da abertura, às 19h.
“Meu quintal é maior que o mundo” | Casa Triângulo
08.02 – 22.03
O título, inspirado no poema “O Apanhador de Desperdícios” de Manoel de Barros, aponta para a dimensão afetiva e simbólica do quintal, um território onde o cotidiano e o imaginário se encontram. A mostra, curada por Priscyla Gomes, apresenta 23 artistas brasileiros, cujos trabalhos — em pintura, escultura, instalação e fotografia — expandem a ideia do quintal como espaço de recolhimento e troca, natureza e artifício, silêncio e celebração. A curadora observa que o quintal pode marcar um limite, mas também abrir caminhos, onde a intimidade se desdobra no desconhecido e o pessoal se mistura ao coletivo.
Hiram Latorre, “S2S2S2” | Martins&Montero
08.02 – 15.03
A galeria apresenta a primeira individual de Hiram Latorre, curada por Yuri Quevedo, onde o artista expande sua prática para novas escalas e dimensões. Com formação em Arquitetura e Urbanismo, Latorre constrói um vocabulário pictórico que combina a precisão do design modernista brasileiro com referências da cultura do Oriente Médio, sempre ancorado na materialidade do cotidiano e na memória afetiva. Em seu processo, elementos banais se tornam composições que guardam traços de convivências e vínculos, o que o artista chama de “cartas de amor”.
Tiago Sant’ana, “Fulgor Atlântico” | Galeria Leme
08.02 – 22.03
Esta é a segunda exposição individual de Tiago Sant’Ana na galeria, onde a cor se torna um eixo para pensar história, ancestralidade e linguagem. No centro da mostra está a série “Itutu”, inspirada na filosofia iorubana que orienta tanto a forma quanto o pensamento por trás das obras. O branco e o azul, predominantes na série de trabalhos, além de escolhas visuais, são ferramentas conceituais que carregam séculos de significado. O azul, presente desde o Egito Antigo, atravessa períodos de nobreza no Renascimento até ser ressignificado por artistas da diáspora africana, sobretudo no Brasil. O branco, associado ao sagrado e à sabedoria dos mais velhos, reforça a conexão com a ancestralidade.
Vojtěch Kovařík, “Inner World” | Mendes Wood DM
14.02 – 15.03
“Inner World” é a maior exposição de Vojtěch Kovařík até agora, e reúne 16 obras inéditas entre pinturas e esculturas em bronze, madeira e gesso. O artista tcheco revisita a mitologia grega, mas se detém nos momentos menos narrados, olhando para a passagem do tempo, a finitude e a relação entre memória e presente. A pintura de Vojtěch Kovařík empurra a mitologia para além do cânone, ampliando corpos até o limite da moldura, onde músculos inflados e torsos compactados parecem lutar contra o espaço que os contém. Suas figuras, de cores saturadas e textura quase mineral, têm a rigidez da escultura, mas a escala excessiva as aproxima da caricatura.
Isay Weinfield, “Ininteligibilidade” + “Adiar a ordem” | Galatea
11.02 – 12.03
A mostra reúne um conjunto de objetos que, isolados, seriam triviais, mas, combinados, parecem sugerir alguma coisa que nunca se revela por inteiro. Bonecos de porcelana, flores artificiais e molduras, recolhidos em mercados e feiras pelo arquiteto ao longo dos anos, são reorganizados em composições que fazem do absurdo um comentário silencioso. As relações entre as peças são tênues, às vezes engraçadas, outras apenas deslocadas o suficiente para tornar impossível ignorá-las. Weinfeld não força a mão na ironia nem se prende a significados fechados — o que ele faz é torcer a lógica do olhar, criando conexões que parecem fazer sentido, mas nunca de um jeito óbvio.
A galeria também inaugura a mostra coletiva “Adiar a ordem”, com curadoria de Fernanda Morse, reunindo Bianca Madruga, Carolina Cordeiro, Cinthia Marcelle, Isadora Soares Belletti, Leila Danziger e Maíra Dietrich.
OPAVIVARÁ!, “QUEM VIVER VIVARÁ!” | A Gentil Carioca
15.2 – 08.03
O coletivo carioca OPAVIVARÁ!, que completa 20 anos, reafirma sua vocação para criar espaços de encontro, experimentação e participação ativa do público. Serão apresentados trabalhos inéditos no Brasil e novas instalações, todas projetadas para serem ativadas na interação com os visitantes. Em um momento em que o isolamento e a fragmentação das relações sociais seguem como resquícios da pandemia, o OPAVIVARÁ! propõe um gesto contrário: reunir, aproximar, tensionar os diálogos entre obra e público.
Mariana Manhães, “O lado de fora dos ohos fechados” | Central Galeria
15.02 – 30.04
Mariana Manhães apresenta um ambiente que atravessa escultura, instalação e vídeo. A exposição marca um momento de mudança em sua produção. Depois de um período de silêncio, Manhães explora novos materiais e busca formas que escapam de definições prontas. Em vez de encaixar suas peças em categorias como escultura ou instalação, ela prefere deixar que tudo aconteça ao mesmo tempo. No texto crítico da mostra, Ana Avelar descreve essa sensação de mistério, comparando a disposição das peças a um alinhamento megalítico, um encontro entre presenças visíveis e invisíveis.
“O ouro e a madeira” | Quadra
15.02 – 05.04
Com curadoria de Ariana Nuala, a mostra propõe um diálogo entre materialidade, memória e relações de poder. Partindo da dualidade entre o peso do ouro e a leveza da madeira, a mostra tensiona a ideia de valor, deslocando-a das lógicas coloniais que historicamente associam esses elementos à acumulação e ao domínio. Se, por um lado, o ouro simboliza permanência e riqueza, por outro, a madeira remete ao ciclo de vida e transformação, apontando para dinâmicas de resistência e renovação. O pensamento cosmogônico atravessa essa relação, seja na filosofia chinesa, onde madeira e metal se complementam, seja no Candomblé, na união simbólica entre Oxóssi e Oxum. As obras dos artistas presentes não se limitam a esses materiais, mas se orientam por seus contrastes e significados, expandindo o debate sobre valor e pertencimento.
PV Dias | Verve Galeria
15.02 – 15.03
Essa é a primeira individual do artista paraense cuja pesquisa revisita a estrutura racial do sistema prisional brasileiro por meio de intervenções em arquivos históricos. Dividida em dois núcleos, a exposição parte do apagamento imposto pela história para ressignificar imagens e memórias. Em “Que Tenhas o Corpo”, Dias trabalha com registros do século XIX da Biblioteca Nacional, carimbando repetidamente nomes e rostos de pessoas negras condenadas, em um gesto que busca restituir dignidade e presença a esses indivíduos. Já em “Noite do Pau e Corda”, o artista reconstrói uma cena de repressão ao Catimbó na Belém do século XX, quando a manifestação afro-indígena foi proibida sob o pretexto de conter a desordem pública.
Marinalva Rosa, “Porta da saída” | AM Galeria
15.02 – 22.03
Em sua primeira individual na sede paulistana da galeria, a artista mineira apresenta um conjunto inédito de mais de 20 pinturas em tela e papel, dando continuidade a uma pesquisa que toma o cotidiano como ponto de partida, mas sem buscar nele estabilidade ou certezas. Nas obras, tinta fluida se espalha sobre superfícies de cor chapada, criando encontros imprevistos que deixam à mostra gestos inacabados e formas que parecem se organizar e se desfazer ao mesmo tempo. A exposição tem curadoria de Rodrigo Naves e Gabriel San Martin.
“Zanele Muholi: Beleza valente” | IMS Paulista
22.02 – 22.06
O IMS Paulista receba a primeira exposição individual de Zanele Muholi no Brasil, apresentando um conjunto de mais de 100 obras que percorrem diferentes momentos de sua trajetória. Desde os anos 2000, Muholi usa a fotografia para construir um arquivo da comunidade negra LGBTQIAPN+, documentando vidas que foram historicamente apagadas. A exposição inclui trabalhos inéditos produzidos no Brasil e um documentário dirigido por Muholi, além de entrevistas e livros que aprofundam sua pesquisa. No dia da abertura, 22 de fevereiro, a artista participa de uma conversa com o público e de uma sessão de autógrafos.
Tadeu Jungle, “TUDO PODE (perder-se)” | Centro Cultural Fiesp
19.02 – 20.07
O Centro Cultural Fiesp recebe a primeira grande exposição de Tadeu Jungle, que reúne trabalhos de mais de 45 anos de produção. Herdeiro da poesia concreta e pioneiro da videoarte no Brasil, Jungle sempre transitou entre linguagens, explorando a palavra, a imagem e a tecnologia de maneira irrestrita. A mostra, com curadoria de Daniel Rangel, apresenta desde suas primeiras intervenções urbanas, como a pichação “Ora H” nas ruas de São Paulo nos anos 70, até instalações inéditas que expandem sua pesquisa em diferentes suportes, incluindo tapeçaria, alumínio, mármore e bronze. O espaço expositivo se desdobra para além da galeria, com projeções na cidade, ações online e debates, reforçando o caráter experimental de sua obra.
Bárbara Wagner & Benjamin de Burca, “Espelho do Poder” | Sesc Paulista
20.02 – 03.08
Com curadoria de Clarissa Diniz e projeto expográfico de Juliana Godoy, a mostra propõe uma experiência entre cinema, música e performance. No lugar de uma exibição convencional, os filmes Swinguerra (2019) e One Hundred Steps (2020) são apresentados como um espetáculo conduzido pela voz de Indra Haretrava, que comenta as obras e seus contextos. A ideia é transformar a sala de projeção em um espaço de troca, onde a relação entre imagem e espectador se torna mais aberta e participativa. Essa colaboração faz parte do método de Wagner & de Burca e atravessa toda a exposição, que também incorpora recursos de acessibilidade como audiodescrição e videolibras.