Para comemorar o Dia de Iemanjá, convidamos a artista e curadora Ana Beatriz de Almeida para falar sobre criativos que pesquisam o tema

Conheça quatro artistas que pesquisam a entidade que é celebrada, no Brasil, como dona do mar

por Beta Germano
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Tchidohun, de Ana Beatriz de Almeida
Tchidohun, de Ana Beatriz de Almeida

Mestre em História e Estética da Arte pela Universidade de São Paulo, Ana Beatriz de Almeida é co-fundadora da plataforma de arte 01.01, curadora, artista visual e historiadora da arte com foco nas manifestações africanas e da diáspora africana. Ela é professora do curso Black Feminism, na Berkeley University, e curadora convidada do Glasgow International 2020 (adiado para 2021 por causa da pandemia coronavírus). No início de 2019, Ana fez uma residência curatorial em Gana, Togo, Benin e Nigéria, na qual conseguiu se reconectar à parte de sua família que retornou ao Benin durante a escravidão. Para comemorar o Dia de Iemanjá, a convidamos para falar um pouco sobre o seu próprio trabalho e sobre outros artistas cujas pesquisas passam pelas entidades afro-brasileiras. 

Ibeji, de Ana Beatriz de Almeida
Ibeji, de Ana Beatriz de Almeida

“​De 2010 a 2019 me dediquei a Gunga, um ciclo de ações performáticas em espaços relevantes para a história da diáspora negra, no intuito de resgatar simbolicamente os que não sobreviveram ao trajeto entre África e Brasil. Em 2010 criei a performance Banzo, na Openbare Bibliotheek, em Amsterdão. Tratava-se de um rito sobre o rapto e  precificação de corpos negrxs, pois foi nesse local que os escrarvos negros foram precificados pela primeira vez. 

Para a Bienal do Recôncavo Baiano, em 2012, performei uma nova versão de Banzo em Cachoeira. Foi um rito sobre xs ancestrais que dedicaram sua por meio da reinvenção das filosofias e cosmologias Africanas no Brasil.  Em 2015, começo a fazer a série Kalunga, com a participação do artista visual Thiago Consp e da videoartista Luara Chiavon: Onira é um vídeo-rito sobre a guerrilheira Helenira Rezende, mulher negra militante assassinada pelo estado em 1972 cujo corpo encontra-se desaparecido até os dias de hoje. Oxalufã é um vídeo-rito sobre João Breno, líder dos Queixadas – grupo de resistência pacífica, que realizou a maior greve da América Latina em período ditatorial, na fábrica de Cimento de Perus. Para finalizer, o vídeo-rito Ibeji que trata do extermínio de crianças e jovens negros, prática de genocidio estrutural que ocupou o lugar deixado pela ditadura nos anos 1960. Promovendo uma onda de ancestrais infantis carentes de ritualização.

Sobre o sacrifício ritual, de Ana Beatriz Almeida
Sobre o sacrifício ritual, de Ana Beatriz Almeida

A partir de 2017, começo uma reflexão sobre o ritual do sacrifício. Pesquiso sobre  os corpos sacrificados na construção do Brasil e sua divinização. A obra Sacrifício Ritual trata de uma iniciação acerca do corpo performático construído a partir do processo de imersão enquanto passista da Escola de Samba Vai Vai, em 2017. O processo teve como referência a prática de iniciação no Vodoun, no Benin – e em alguns terreiros de candomblé no início do século XIX – que consiste na travessia do mercado e aquisição de sua própria alma. Já rito-performance Tchidohun parte da divinização ancestral do corpo coletivo de mulheres negras que dedicaram sua vida à construção da identidade brasileira”.

Abaixo, alguns artistas pesquisam sobre a influência de Yemonja (nome original do orixá), que reverbera e é celebrada nos quatro cantos do Brasil. “Ainda que Iemanjá, em território nigeriano seja um rio, aqui ela é celebrada como a dona do mar”, ressalta Ana. 

Sobe Antepasadas, de Amara Smith
Sobe Antepasadas, de Amara Smith

Amara Smith

O mar visto enquanto subjetividade ancestral e histórica é o foco do trabalho da californiana Amara Smith,  que produz materialidade para este ente através do corpo de mulheres negras. Sobe Nossas Ancestrais é uma performance que homenageia grandes conceitos filosóficos relacionados ao universo uterino, tanto na Santeria quanto no Candomblé: Olokun, Nana Buruku, Mami Watta e Yemanja. Estes conceitos filosóficos estão fortemente ligados ao mar, que enquanto sujeito torna-se personagem central da escravidão, a morte e a materialidade. Enquanto sacerdote de Lukumi e acadêmica, Amara Smith produz uma teia crítica e simbólica relacionados com a ética e estética das mulheres negras da diáspora.

Amália Coelho

Amália Coelho aborda o tema da água, em perspectivas iorubás, enquanto proposta de reversão da colonialidade.  Em Ipori, a artista quilombola leva água de seu quilombo no interior de Minas para Osogbo, a cidade de Osun. Neste trajeto a artista de Serra do Gandarela propõe um diálogo entre passado e presente, onde a cartografia colonial é reconstruída. A partir de lógicas suprimidas pelo racismo e machismo, a artista propõe outra lógica de tempo e espaço e pertencimento.

Segundo a artista: “Ìpòri na cosmologia Yoruba é um dos elementos da alma, simboliza a energia ancestral ligada à nossa cabeça (Orí), ao nosso ancestral (Eledá) e nosso destino (Odu). É um conceito que une os homens em uma cadeia global. O Ìpòri relaciona-se com a placenta e a origem da vida.”

Blitz Bazawule

O multi artista ganense Blitz Bazawule desenvolveu o último estágio da Trilogia Diaspórica no Brasil. Nesse último vídeo, Bazawule desenvolve a relação entre a morte prematura, os gêmeos e as condições de vida para aqueles que nasceram no cativeiro para o qual seus ancestrais foram levados. Desta forma ele desenvolve uma perspectiva alternativa sobre pertencimento racial, onde a morte ( Iku)  é parte da vida. A dicotomia e os revezes surgem como um fator para driblar uma sociedade baseada na morte e adoecimento de pessoas negras. Esta leitura remete a lógica do candomblé, grupo que tem participação especial na obra, como: Anita Costa e  Daiane Costa, respectivamente sacerdote e integrante do terreiro angola Nzo Mungongo Lembeuaji Junsara, majoritariamente feminino e negro. 

O trabalho de Bazawule e sua trilogia é fundamental para entender sua contribuição como diretor da obra Black is King da também multiartista Beyonce Carter. 

Aretha Sadick
Aretha Sadick

Aretha Sadick

Aretha Sadick é uma artista carioca que questiona o corpo e os limites biológicos e sociais da humanidade através de seu próprio corpo. Durante a pandemia, a artista desenvolveu uma série performática com cunho pedagógico e social no qual ela introduz filosofias de matriz Yorubá a partir do entrecruzamento entre a produção musical brasileira e itans (unidades filosóficas que compõe o sistema lógico yoruba). A série é o desenvolvimento do trabalho prévio da artista. Aretha Sadick é artista integrante da 01.01 Art Platform que conta com uma rede nacional e internacional de artistxs negrxs.

No video criado para o seu Instagram aqui, ela introduz o conceito guia deste Take Over, Yemanja, e ainda apresenta outros princípios filosóficos mencionados aqui como Iku e Olokun.

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