Uma das mais importantes mostras programadas para 2020 pela equipe curatorial do MASP, a exposição Hélio Oiticica: a dança na minha experiência abriu semana passada virtualmente. A exposição inaugura o ciclo Histórias da Dança foi idealizada junto com um belíssimo catálogo com textos do próprio artistas sobre sua obra e de importantes intelectuais que dissecam sua obra de Hélio Oiticica sob diferentes e surpreendentes pontos de vista, além de uma potente seleção de imagens de arquivo e de peças que o público poderá ver quando a pandemia do COVID-19 estiver controlada e os museus puderem reabrir as portas.
O projeto gráfico, assinado pela Bloco Gráfico, busca interpretar visualmente alguns aspectos da obra do artista como o rigor geométrico, a materialidade e o movimento. A publicação começa, então, com um interessantíssimo jogo entre recortes de Metaesquemas e imagens de pessoas usando e dançando com os Parangolés e termina com outros detalhes de Metaesquemas e frames de um vídeo (presente na mostra) em que Hélio dança com a amiga Lygia Clark – escolhas gráficas para expor a ideia central da exposição que visa mostrar como o trabalho do artista apresentava componentes rítmicos e dinâmicos desde as primeiros séries. O miolo é impresso em três diferentes tipos de papel garantindo que o livro incorpore o aspecto tátil e a sensibilidade material tão presente nos Bólides e nos Penetráveis. A paleta de cores, verde e rosa, é uma homenagem à Escola de Samba da Mangueira pois o contato de Hélio com o grupo e com o samba foi crucial para a sua relação com a dança se estreitar.
O texto de abertura é assinado pelos curadores Adriano Pedrosa e Tomás Toledo onde eles explicam um pouco sobre cada fase da trajetória de Hélio Oiticica presente na mostra. O ponto de partida é o Parangolé e, a partir dos elementos coreográficos e dos movimentos de cor e forma presentes nele, os curadores percorrem pelas diferentes séries criadas pelo artista – dos Metaesquemas (1956-1958) aos Relevos Espaciais (1959-1960), Núcleos (1960-1966), Penetráveis (1961-1980), Bólides (1963-1979) e finalmente os próprios Parangolés (1964-1979).
No seu texto Adrian Anagnost expõe a diferença entre a “performance”que surgia nos anos 1960, em diferentes países, e a “dança” de Oiticica – um fenômeno que era, para o artista, essencialmente social, convival e integrado ao ritual. E discute se a apropriação dos movimentos do samba e de gestos corporais que fazem parte do cotidiano do carioca médio na obra de Hélio Oiticica . Sugere considerar, então, seu trabalho como uma espécie de readymade. Já a curadora Vivian Crockett escreveu sobre a relação de Hélio com o rock e possíveis negações de influências negras tanto na nossa noção do que era o rock dos anos 1960 e 1970 quanto no trabalho do artista – o que parece intrigante já que ele sempre esteve interessado no combate às divisões de raça e classe, buscando eliminar preconceitos e estereótipos. Vale conferir, ainda, o texto de Evan Moffitt que discute a poética queer no trabalho do artista. Não deixe de ler, ainda, os textos de André Lepecki, Tania Rivera, e Fernando Cocchiarale. Um livro lindo para a sua estante que traz muitas questões para refletir até a reabertura do museu.