Após um intervalo de cinco anos, a cantora e compositora brasileira IZA lançou, no dia 03 de agosto, seu segundo álbum de estúdio: “Afrodhit”. Apesar dos elogios às composições, que falam sobre as várias camadas das experiências de amor vividas pelas mulheres, os visuais que os acompanham têm roubado a cena com suas referências da história da arte.
Um dia antes do aguardado lançamento, a cantora tirou o fôlego dos usuários do Instagram ao publicar as fotos de divulgação em que ela aparecia na mesma posição da deusa retratada em “O Nascimento de Vênus” de Sandro Botticelli. Os cliques foram tirados pela dupla MAR+VIN, composta por Marcos Florentino e Kelvin Yule, que ascenderam no mercado de moda, mas hoje também conquistaram seu espaço nas artes visuais e são representados pela Galeria Mario Cohen.
Seja como Afrodite na mitologia grega, ou Vênus na crença romana, a divindade era vista como o auge da beleza, sendo capaz de seduzir qualquer homem ou outro deus. A comoção e os comentários na internet não negam: não é difícil de associar a imagem de IZA a de uma deusa. Mas é importante contextualizarmos este fato na história da representação feminina e refletirmos sobre seus significados. Em tempos de resgate do culto à magreza excessiva, embalados na nostalgia da estética dos anos 2000, a cantora consegue se estabelecer como ícone de beleza ao disseminar imagens do corpo real de uma mulher negra, rompendo com ciclo normativo.
O único clipe lançado até a publicação deste artigo é chamado “Fé nas maluca”, que conta com a direção criativa da artista Nídia Aranha. A história apresentada no vídeo confabula a vingança da “Mulher de Pedra”, uma deusa encontrada em um garimpo e explorada por homens que comercializam as pedras preciosas de suas unhas e umbigo. Logo nas primeiras cenas, vemos IZA tomando banho de bacia e mais uma vez, posando como a Vênus de Botticelli que emerge do mar.
A cantora comenta que a realidade de diversas mulheres que compuseram a letra juntamente com ela, se cruzam ali. O resultado é uma compreensão da realidade feminina e das heranças coloniais no Brasil, além dos limites entre o cuidado protetor e a violência, lidos sob uma ótica de posicionamento e ruptura.
Já no visualizer de “Mega da Virada”, temos um spoiler de outra referência: uma escultura inspirada na Vênus de Willendorf, considerada uma das primeiras representações femininas na arte. A pequena estatueta pré-histórica é notavelmente voluptuosa, com ênfase nos seios, quadris e ventre. Os pesquisadores sugerem que ela poderia ter sido objeto de adoração por retratar uma divindade feminina, possivelmente ligada à fertilidade, à terra e à natureza, ou então uma representação simbólica de mulheres e figuras femininas em geral.
A cantora explicou em entrevista ao Papelpop, que a ideia por trás dessas referências era criar uma narrativa em que a deusa reencarna diversas vezes em diferentes representações ao longo dos tempos. Na fabulação da cantora, “Afrodhit” teria ressurgido, desta vez, do centro da Terra e caído no contexto urbano.