Depois que Beyoncé e Jay-Z literalmente fecharam o Louvre para produzir um potente clipe lacração cheio de militância antirracista, o grupo musical brasileiro Heavy Baile lançou, ontem, um vídeo da faixa Noturno 150 em parceria com o The Metropolitan Museum of Art.
A obra, com direção e direção de fotografia de Daniel Venosa da Cosmo Filmes, começa com o dançarino Ronald Sheick em casa – isolado como todos nós – fumando um charuto. Entediado, o personagem pega o celular e inicia uma experiência que hoje é bastante comum para qualquer amante e arte: ele “entra” no museu nova iorquino por meio de um programa que leva o espectador para uma versão 3D das salas dos museus. Começa, assim, uma breve e animada história da arte cuja narrativa foi costurada pelas batidas já famosas do grupo que misturam funk e música eletrônica e pela coreografia criada por Sheick!
Foi numa madrugada de junho, no auge da quarentena para evitar o contágio do COVID-19 (ainda não acabou gente, vale lembrar!) que Venosa teve o insight. Ele estava pesquisando umas referências para outro trabalho quando viu APESHIT, a superprodução de Beyoncé e Jay-Z no Louvre – imagine quantos trâmites e dólares foram necessários para realizar este clipe! “Era um momento em que todos estávamos em casas impedidos de fazer produções em locações. Essa situação é muito particular porque equaliza todo mundo quando pensamos em limites para a criação: o que importa agora é a ideia.”, explica Venosa que “caiu” no google art and culture logo depois de ver a criação norte-americana. “Fiquei passeando pelos museus e achei bacana o fato de você poder dar um zoom nas pinturas para vê-las melhor. Tive, então, a ideia de inserir um bailarino nelas!”. Ligou, então, para Leo Justi, um dos líderes do Heavy Baile, que logo aprovou a produção do clipe.
E porque o Met? “Tenho uma relação muito forte com esse museu. Visito sempre e é o único desses grandes onde eu não me perco”, brinca. A paixão pelo museu também tem dedo do amigo pintor Gabriel Giucci: “Ele tem fixação pelas pintura de lá e ele, inclusive, compra mais de um ticket quando vai para garantir a experiência de ficar sozinho na frente de alguma obra por um tempo”, explica o diretor. A seleção das obras ficou por conta de Venosa e a curadora Gabriela Davies. A ideia inicial era fazer uma seleção só de grandes mestres que estudaram a paisagem como William Turner e Gustave Courbet, mas Davis sugeriu também a incorporação de imagens de Edgar Degas- afinal, o pintor era apaixonado por dança!
“O Daniel queria paisagens e um campo aberto onde o Sheick pudesse dançar. Mas quando você olha para o acervo do Met, há uma diversidade tão grande de períodos e estilos que acabamos incluindo outras pinturas.”, explica a curadora que se preocupou em “transportar” Sheick para ambientes bastante diferentes, muitas vezes opostos: de uma noite na praia, ele salta para um campo florido ou uma paisagem coberta por neve; ou, de ambientes internos ele migra para espaços abertos. Mas realmente o mais interessante é ver Sheick dançando Passinho numa espécie de duelo com as bailarinas de Degas. “O que acaba sendo muito relevante é como um dançarino brasileiro entra no imaginário desses pintores europeus. Um carioca invadindo, de certa forma, o espaço daqueles que foram colonizadores”, completa Davies que usou obras desde o século 17 até o 19.
Com as obras definidas, eles montaram um cromaqui na sede da Cosmo Filmes na frente do qual Sheick dançou a coreografia para a posterior inserção das pinturas. Mas a gravação e montagem não foram simples. Para evitar a luz artificial, Venosa estudou a iluminação de cada quadro mapeado os horários da pintura para filmar usando as mesmas luzes produzidas pelos artistas. Ele também tentou acompanhar os pontos de fuga e perspectiva das obras. Trabalho árduo que valeu a pena: a música, a dança e as imagens de Noturno 150 não saem da nossa cabeça!