“Desenhar é um estilo de vida. É uma atividade privada que você faz basicamente quando ninguém está olhando. E aqui estamos nós, numa situação em que ninguém poderia estar olhando. Estamos sentados pelas nossas casas tentando tentando encontrar nosso caminho para um mundo imaginário que fará nossa vida melhor. Então, estou imaginando figuras que estão distantes uma das outras: elas não querem estar, mas precisam estar separadas. São figuras que eu inventei, mas que lembram pessoas que eu queria ver e de alguma maneira elas são um reflexo dos meus sentimentos internos sobre a situação de ser deixado sozinho aqui nesta região selvagem”, declara George Condo sobre sua exposição virtual que acaba de abrir na galeria Hauser & Wirth.
Enquanto escuta John Coltrane em seu ateliê em NY, o artista americano tenta lidar com a pandemia do COVID-19 criando desenhos para a série “Distanced Figures” que, como o próprio artista explicou acima, são retratos que evocam a experiência do isolamento durante esse período perturbador de distância social.
Representadas em giz de cera, lápis e tinta, as composições são formadas por várias figuras sobrepostas criando camadas e combinando vários pontos de vista para refletir diferentes emoções que ocorrem simultaneamente: medo, paranóia, claustrofobia, pânico e angústia – estão todos presentes, mas manipulados com tanta beleza, que proporcionam quase que um antídoto para momentos tão difíceis. Como o artista ressalta, são representações de indivíduos “distanciados um do outro ou de fato até distanciados deles mesmos.” As figuras nesta nova série geralmente aparecem em pares, ligadas por linhas que se cruzam, mas seus olhares não se conectam.
O som acelerado de Coltrane ocupando o estúdio tem uma razão: Condo expõe uma visão experiência catártica da arte em tempos do bloqueio e afirma que gosta de desenhar de forma acelerada e livre, como as notas do ícone do jazz, e compara o andamento de suas obras com uma peça musical. E ressalta que, na sua opinião, “os artistas devem pintar o ritmo sem perder um traço, da mesma maneira que músicos como Jimi Hendrix ou Glenn Gould tocam sem perder nenhuma nota”. No entanto, não se engane: é necessário mesmo grau de atenção, ele garante, ao desenhar lentamente, basta pensar em Bach!
Um dos nomes mais relevantes da arte contemporânea norte-americana, Condo ganhou notoriedade por sintetizar linguagens e motivos pictóricos para criar o que ele descreve como “compostos de vários estados psicológicos”. Desta forma os temas dos desenhos da exposição virtual não apenas respondem à nossa situação atual e à ausência de contato humano, mas também são uma continuação dos temas recorrentes no trabalho do artista. Em Separated by life, pintado em 1986, por exemplo, a apartação física entre as figuras indica estados psicológicos subjacentes de desconexão – muito parecidos com os que vivemos hoje.
Para o artista, a condição de isolamento também carrega conotações positivas de reclusão no espaço do estúdio, garantindo privacidade e intimidade que muitas vezes são difíceis alcançar quando o mundo está normal. Afinal, o normal virou busy. “Adoro desenhar e o contexto habitual de privacidade (…) é um espaço para criar sem ser observado”, ressalta.
Em tempo: A Hauser & Wirth doará 10% dos lucros de exposições on-line ao fundo de resposta de solidariedade COVID-19 para a WHO. A ação faz parte de uma iniciativa filantrópica do #artforbetter.