Sally Gabori é um dos maiores nomes da arte contemporânea australiana e possui uma trajetória artística bastante incomum e inspiradora. Nascida Mirdidingkingathi Juwarnda Sally Gabori, mais ou menos em 1924, a artista pertenceu ao povo Kaiadilt, um dos últimos povos aborígenes australianos a entrarem em contato com colonizadores europeus e que viviam isolados em uma pequena ilha chamada Bentinck.
No início da década de 1940, os missionários presbiterianos, instalados desde 1914 na ilha vizinha de Mornington, passaram a fazer sucessivas tentativas de colonização com os Kaiadilt, mas sem sucesso algum. Em 1948, entretanto, após um ciclone e um tsunami inundarem as terras do povo de Gabori, os 63 últimos representantes do povo Kaiadilt são evacuados com destino à missão presbiteriana. O eles pensavam que seria um rápido exílio tornou-se uma partida definitiva à medida que, ao chegarem à missão, as crianças foram separadas dos adultos e proibidas de falar sua língua materna, rompendo os laços com sua cultura e tradição e exterminando, por fim, qualquer possibilidade de continuidade do povo.
Muitos anos mais tarde, em meados de 2005, Sally Gabori descobre a pintura pela primeira vez ao visitar o centro de arte de Mornington o que é, para ela, uma verdadeira revelação. A recém-artista se põe, então, a pintar freneticamente produzindo, às vezes, mais de uma tela por dia e construindo assim a sua própria tradição pictórica e completamente desconectada de qualquer outra corrente artística. E é justamente o fato de ela não possuir nenhum contato anterior com qualquer tradição iconográfica o que faz de seu trabalho tão poderoso e original.
Nas obras em exposição em dois andares da Fundação Cartier em Paris, vemos nas telas de Gabori a representação – e uma verdadeira celebração, de lugares específicos de sua Ilha Natal e das pessoas de sua família. Em apenas nove anos de produção artística, Gabori pinta mais de 2000 telas com uma singular combinação de cores, jogos de forma e sobreposição de superfícies. No primeiro andar da exposição estão as telas ligadas a Thundi, um lugar da sua ilha natal, bem como trabalhos realizados em colaboração com outros artistas kaiadilt. Já no subsolo estão as telas ligadas aos lugares Dibirdibi e Nyinyilki.
Exibindo mais de 30 trabalhos de Gabori, a mostra em cartaz na Fundação Cartier foi construída em colaboração com a família da artista, ao lado do povo kaiadilt e sustentada pelo conhecimento de especialistas sobre o povo. Com mais esta exposição, a Fundação Cartier enfatiza uma busca, cada vez maior, de conceder um lugar de destaque à produção artística de povos nativos de diversas partes do mundo como, inclusive, já o fez com indígenas Yanomamis do Brasil.
Serviço:
Sally Gabori
Local: Fundação Cartier
Endereço: 261 Bd Raspail, Paris, França
Data: Até 6 de novembro de 2022
Funcionamento: De terça a domingo, das 11h às 20h.
Ingresso: 14 – 7 euros.