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Foi dado o “Kick Off” da 12ª Bienal de Berlim

Intitulada Still Present!, esta edição da Bienal de Berlim chega com uma clara intenção de dar voz a artistas que estão fora do eixo da arte ocidental

por Beta Germano
Sinni, coastal Vedda woman, Vandalous-bay, North of Batticaloa, Sri Lanka, 2019, Deneth Piumakshi Veda Arachchige. © Deneth Piumakshi Veda Arachchige

Esta talvez seja a edição mais politizada de todas as Bienais de Berlim desde 1998, ano em que ela foi inaugurada, e, sem dúvida, uma das mais badaladas. O motivo é a coincidência de datas que estão unindo três “major” eventos arsty em um único mês: a Bienal de Berlim; a Art Basel, que começa dia 16 de junho; e a Documenta de Kassel, que começa dia 18 de junho e é o maior e mais tradicional evento de arte da Alemanha. O artista franco-algeriano Kader Attia, à frente do seleto grupo de curadores internacionais responsável por esta edição da Bienal, contou durante a coletiva de imprensa que enquanto estava preparando o evento uma indagação veio à sua mente: “Sem fingirmos que uma exposição de arte possa mudar o mundo, como podemos contribuir para uma leve reorientação da percepção de mundo das pessoas?”. 

A resposta para a sua questão é, provavelmente, a edição mais ousada de todas as Bienais de Berlim, intitulada Still Present! e carregada por uma forte dose de manifestações políticas e indagações provocativas que vai fazer com que cada um dos visitantes deixe a exposição no mínimo pensativo. Para conseguir que essa edição realmente se destacasse entre as anteriores, o curador montou um grupo curatorial composto por cinco mulheres de diferentes nacionalidades, o que concedeu uma maior diversidade ao corpo de artistas, que traz vários nomes fora do eixo da arte ocidental. Ao todo, são 70 artistas e coletivos  que apresentam suas obras por entre os seis espaços expositivos do evento. Colocado no cerne da discussão está o papel do capitalismo na crise global, focando particularmente na descolonização e na crise climática. 

O evento, que inaugura hoje, dia 11 de junho, e se estende até o dia 18 de setembro. Separamos os artistas e as obras mais marcantes desta edição, confira a seguir:

Deneth Piumakshi Veda Arachchige

Auto-Retrato como Restituição – do ponto de vista de uma feminista, Deneth Piumakshi Veda Arachchige.

Deneth Piumakshi Veda Arachchige é uma artista nascida multidisciplinar nascida do Sri Lanka, em 1980. Em seu trabalho ela utiliza vídeo, pintura, estampas e bordados em diferentes superfícies. Seu trabalho gira em torno de diferentes temáticas, história coloniais esquecidas, diáspora do Sri Lanka, injustiças sofridas por mulheres trabalhadoras imigrantes, histórias de crianças que crescem em zonas de guerra e feminismo. Segundo ela, sua prática se encontra em um limiar sútil entre o ativismo e a arte. 

Para a Bienal de Berlim a artista produziu uma escultura bastante incomum, a artista fez uma impressão 3D de seu próprio corpo que é apresentado ao público com os seios nus, um semblante amedrontado e segurando um crânio. Em seu corpo impresso estão escritas as frases “cor do peito ligeiramente mais escura do que VII” e “Weddas (minoria indígena do Sri Lanka) de legítimo puro sangue” que remetem a termos usados por cientistas para caracterizar corpos negros. A obra foi batizada de Auto-Retrato como Restituição – do ponto de vista de uma feminista. 

Sammy Baloji

Instalação de Sammy Bajoli.

Sammy Baloji é um fotógrafo nascido em 1978 na República Democrática do Congo. Seu trabalho é debruçado sobre a história de Lubumbashi, maior cidade de seu país, durante o século XX, com suas raízes conectadas com o povo congolês. Baloji enxerga o próprio trabalho como uma forma de analisar a identidade africana nos dias de hoje e explorar o presente de seu país (re)contando a sua história pela perspectiva de seu povo. 

A obra que Baloji apresenta nesta edição da Bienal é, sem dúvidas, das mais surpreendentes. Em uma grande instalação o artista reproduz uma espécie de estufa que remete ao Wardian Case, um terrário usado durante o século XIX para transportar plantas exóticas das colônias à Europa. Para Baloji, a obra figura como uma metáfora sobre como os homens provenientes das colônias eram implantados nas guerras da Europa. 

Lawrence Abu Hamdan

Air Conditioning, 2022, Lawrence Abu Hamdan.

A prática artística de Lawrence Abu Hamdan, nascido em 1985 na Jordânia, é bastante incomum. O artista, que participou da 34ª Bienal de São Paulo, trabalha decodificando o mundo através do som, liderando investigações de áudio e descobrindo verdades como o tráfico de mercadorias ou a realidade em uma prisão síria. Para Hamdan o testemunho das orelhas e não o dos olhos é a mais frequente fonte de evidência por um único motivo: o áudio vaza. E são precisamente esses “vazamentos” que o artista capta e disseca. 

A obra do artista em exibição na Bienal deste ano chama-se Ar Condicionado e consiste em um imenso painel, que ocupa três paredes inteiras, de uma impressão digital panorâmica. O artista, baseado em Beirute, no Líbano, compilou meticulosamente a vigilância militar de Israel sobre o Líbano durante um período de 15 anos. O resultado são nuvens pretas e cinzas contra o azul do céu, o peso de cada nuvem foi determinado pelo número de aviões na atmosfera em cada dia. No painel, cada dia de observação é representado por 1 cm. O artista realizou o trabalho alimentando um software de animação 3D que cria nuvens artificiais para video games e filmes. O resultado é uma síntese entre jornalismo de dados, pesquisa política e arte. 

Basel Abbas e Ruanne Abou-Rahme

Oh Shining Star Testify, Basel Abbas e Ruanne Abou-Rahme.

Basel Abbas e Ruanne Abou-Rahme são um dupla de artistas paletino-americano que trabalham juntos explorando som, imagem, texto, instalações e performances. Sua prática é engajada nas interseções entre performance, imaginários políticos, corpo e virtualidade sondando uma paisagem contemporânea marcada por uma perpétua crise e um “eterno presente” formado pela política do desejo e do desastre. Com seu corpo de trabalho, a dupla experimenta uma nova forma de narrativa, imaginário e linguagem que não esteja conectada com os discursos coloniais e capitalistas e que permitam uma reimaginação do presente. 

Eles levam esta experimentação à Bienal com o trabalho Oh Shining Star Testify, uma vídeo- instalação composta por imagens de câmeras de vigilância militar de Israel. Em março de 2014, um menino de 14 anos chamado Yusuf Shawamrech atravessou a cerca uma cerca de separação erguida pelas forças militares de Israel para colher Akoub, uma planta típica da culinária palestina, caindo em uma emboscada e sendo morto a tiros. O trabalho dos artistas une fragmentos de imagens de violência como esta.

Dana Levy

Erasing the Green , Dana Levy.

Dana Levy nasceu em Tel Aviv, em Israel, e é conhecida por seus vídeos poéticos, esculturas e instalações que exploram o lugar, o deslocamento e as migrações expondo as tensões entre a arquitetura, a natureza, o meio ambiente e a história humana. 
Nesta edição da Bienal, Levy apresenta um trabalho que conecta a ocupação política das terras palestinas à decadência ecológica. Intitulado de Erasing the Green (2021/2022), a obra em suporte de vídeo consiste em documentos, fotografias e mapas que observam a degradação das terras palestinas e o gradual desaparecimento da “Linha Verde”- a linha do armistício que separa Israel da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental antes da guerra de 1967.

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