Hans Hartung, “T1982-H31”, 1982. Antibes, Fondation Hartung-Bergman © Coleção: Fondation Hartung-Bergman © Hans Hartung / Adagp, Paris 2025
As Ninfeias de Monet há muito são vistas por artistas e estudadas por historiadores como o exemplo máximo da pintura abstrata, uma precursora sensível das grandes instalações imersivas que viriam depois. No entanto, o efeito desfocado que caracteriza as vastas extensões de água nas imponentes telas de Monet foi pouco explorado. Seus contemporâneos não deixaram de notá-lo, mas o atribuíram à deterioração da visão do artista, causada por uma doença ocular. Hoje, parece mais pertinente e revelador considerar esse aspecto da fase final de sua obra como uma escolha estética deliberada, deixada à posteridade para ser desvendada.
Esta exposição assume conscientemente o desfoque como uma chave de leitura, abrindo uma nova interpretação para um campo inteiro da criação visual moderna e contemporânea. Inicialmente definido como uma “perda de nitidez”, o desfoque revelou-se o meio de expressão privilegiado em um mundo onde reina a instabilidade e a visibilidade se encontra turva.
Foi sobre os escombros deixados pela Segunda Guerra Mundial que essa estética do fora de foco lançou raízes e passou a revelar sua dimensão política inevitável. O princípio cartesiano da clareza e distinção, que por tanto tempo prevaleceu na arte, já não se mostrava mais eficaz. Com a erosão das certezas visíveis e diante da multiplicidade de caminhos possíveis, os artistas propuseram novas abordagens, moldando suas obras a partir do transitório, da desordem, do movimento, da incompletude e da dúvida. Reconhecendo uma mudança fundamental na ordem do mundo, eles optaram pelo indeterminado, pelo indistinto e pela sugestão. Esse distanciamento da clareza naturalista veio acompanhado de uma busca por polissemia, expressa na permeabilidade entre mídias e na importância crescente atribuída à interpretação do espectador. Instrumento de sublimação, mas também manifestação de uma verdade latente, o desfoque tornou-se tanto sintoma quanto remédio para um mundo em busca de sentido.
Essencialmente escorregadia, a estética do fora de foco se constrói pelo afastamento — não em oposição direta à objetividade clínica de um mundo sob vigilância constante, mas como um equilíbrio nas fissuras da realidade. Um distanciamento que não nasce da rejeição ou negação da banalidade do mundo, mas da investigação de suas novas modalidades. Às margens do visível, o desfoque, embora revele instabilidade, também cria as condições para o reencontro com o encantamento.
O percurso da exposição é organizado tematicamente, e não cronologicamente. Uma sala introdutória é dedicada às raízes estéticas do desfoque no século XIX e na virada para o século XX, a partir das transformações intelectuais, científicas, sociais e artísticas com as quais o impressionismo cresceu. A mostra se desdobra em três seções que combinam pinturas, vídeos e fotografias. Após a exploração dos limites da percepção em “nas fronteiras do visível”, a seção “a erosão das certezas” aborda o desfoque sob uma perspectiva histórica e política, examinando questões de memória e o status das imagens diante de episódios trágicos da história contemporânea. No entanto, o esmaecimento das imagens vai além do aspecto coletivo: há algo de poético, até mesmo onírico, quando esse recurso toca a questão da identidade e “elogia o indistinto”. Um epílogo amplia a discussão ao refletir sobre a possibilidade de reencontro com o encantamento do mundo, em resposta à afirmação trêmula do artista Mircea Cantor: “futuro imprevisível”.
Artistas participantes
Antoine d’Agata · Dove Allouche · Maarten Baas · Francis Bacon · Léa Belooussovitch · Christian Boltanski · Miriam Cahn · Julia Margaret Cameron · Mircea Cantor · Eugène Carrière · Claire Chesnier · Philippe Cognée · Nicolas Delprat · Vincent Dulom · Bracha L. Ettinger · Wojciech Fangor · Alberto Giacometti · Nan Goldin · Hervé Guibert · Hans Haacke · Joana Hadjithomas · Hans Hartung · Frères Henry · Alfredo Jaar · Khalil Joreige · Y.Z. Kami · Kikuji Kawada · Yves Klein · Bertrand Lavier · Thomas Lélu · Sébastien Lifschitz Collection · Albert Londe · Clémence Mauger · Claude Monet · Tania Mouraud · Edvard Munch · Óscar Muñoz · Zoran Mušič · Mame-Diarra Niang · Eva Nielsen · Albert Oehlen · Claudio Parmiggiani · Estefanía Peñafiel Loaiza · Otto Piene · Sigmar Polke · Krzysztof Pruszkowski · Odilon Redon · Gerhard Richter · Pipilotti Rist · Auguste Rodin · Ugo Rondinone · Medardo Rosso · Mark Rothko · Thomas Ruff · Georges Seurat · Edward Steichen · Christer Strömholm · Hiroshi Sugimoto · Laure Tiberghien · Daniel Turner · Joseph Mallord William Turner · Luc Tuymans · Bill Viola
Curadoria
Claire Bernardi, diretora do Musée de l’Orangerie
Emilia Philippot, curadora-chefe, diretora-adjunta de estudos do Institut National du Patrimoine (INP)
Em colaboração com Juliette Degennes, curadora do Musée de l’Orangerie
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