Em 1988, celebrou-se entre nós o centenário da Abolição da Escravidão, e várias iniciativas, de caráter público ou privado, foram promovidas para festejar a efeméride. O mesmo ano via surgir a nova carta magna da República, a Constituição que ampliava ou instituía direitos até então recusados a mulheres, negros, negras e originários. A celebração também deu ensejo a protestos daqueles que, justamente, entendiam ser pífios os avanços do combate às desigualdades de raça, gênero e classe, profunda e historicamente arraigadas na sociedade brasileira.
Nessa ocasião, tanto a exposição A Mão Afro-Brasileira – Significado da contribuição artística e histórica, organizada por Emanoel Araujo e realizada no MAM, quanto a nova Constituição foram resultados da luta obstinada daqueles que entendiam a necessidade de construir uma sociedade que, por ser justa e igualitária, seria também mais comprometida com a democracia.
O lapso de tempo que separa a exposição de 1988 desta, Mãos: 35 anos da Mão Afro-Brasileira, foi repleto de acontecimentos historicamente significativos, que acabaram por confirmar a relevância das instituições culturais do país, pois afirmam, igualmente, a importância central que a educação (formal e não formal) ocupa no combate às mazelas que secularmente nos assombram. Entre elas, o racismo estrutural que, apesar dos avanços que paulatina e lentamente vão sendo feitos, permanece, infelizmente, como característica comum ao cotidiano de milhões de afrodescendentes que são por ele infelicitados.
Entre as importantes conquistas observadas está, justamente, o debate sobre a constituição dos acervos dos nossos museus e sobre como eles espelham, ou não, a diversidade étnica, de gênero e classe da população do país. No momento em que se estabelece o necessário e profícuo debate sobre a relevância e circulação da produção intelectual e artística de minorias secularmente excluídas, convém lembrar a importância pioneira da mostra de 1988.
A exposição Mãos acaba por celebrar a memória de Emanoel Araujo – criador do Museu Afro Brasil, que hoje recebe seu nome –, um polímata que, falecido há um ano, no dia 7 de setembro de 2022, catalisou, a partir da sua pioneira e corajosa atuação, a vontade de todos os que desejam a promoção da cultura afro-diaspórica, por entendê-la parte valiosa e inextrincável de um patrimônio que pertence a toda a humanidade.
Claudinei Roberto da Silva
curador
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