Home EditorialArtigos Os anos 1960 de Antônio Dias

Os anos 1960 de Antônio Dias

por Julia

O paraibano Antônio Dias foi um dos mais relevantes artistas brasileiros. Sua obra se ancorou principalmente na pintura, mas uma pintura que lançava mão de texturas distintas, volumes e objetos, colagens e diferentes materialidades. O tom político de sua primeira produção é inegável, tendo em vista o contexto da Ditadura Militar no Brasil, a crescente censura e repressão, e o próprio meio da arte que já vinha respondendo ao golpe de 1964.

Notas sobre a morte imprevista

Como mote, podemos tomar “Notas sobre a morte imprevista”, de 1965, para falar da primeira fase de sua obra. Feita usando óleo e tinta acrílica, o artista também empregou vinil, madeira e acrílicos sobrepostos à tela, criando um objeto tridimensional na parede. O ‘quadro’ é colocado de maneira deslocada do eixo tradicional, reforçando ainda mais a ideia de uma pintura no campo expandido, inusual. Sobre a superfície, um grid geométrico separa a obra em 4 quadrantes, onde se vêem misturadas figurações muito estilizadas, como das revistas em quadrinhos, numa estética muito pop. Como se colado sobre o último quadrante, um estranho objeto laranja (que remete a uma bóia) tem em seu centro um caixinha que aparenta conter um pedaço de carne, da qual escorre uma matéria escura, meio orgânica. A peça, simultaneamente visceral, pop e industrializada, marca um momento importante na carreira do artista, ao mesmo tempo que situa o momento da Nova Figuração na história da arte brasileira.

Fumaça do Prisioneiro, 1964
Um Pouco de Prata para Você, 1965
Estou pronto

Seguindo-se ao concretismo e ao neoconcretismo, o retorno à figura marca neste percurso um retorno à discursividade, ao lado de nomes como Rubens Gerchman, Claudio Tozzi e Wesley Duke Lee. É ainda entre 64 e 65 que Dias pinta “Fumaça do Prisioneiro”, “Um Pouco de Prata para Você” e “Estou pronto”, conjunto que o consagrou como figura central desse movimento de retorno à figuração. Foi desse destaque que resultou sua participação na Bienal de Paris de 1965, à qual o artista visita com a ajuda do crítico Pierre Restany. Com uma parca bolsa concedida pelo Governo Francês, Dias vive na capital francesa por mais ou menos 2 anos, até mudar-se para Milão, em 1968. Este é um período de auto-exílio, frente ao acirramento da perseguição política em sua terra natal.

Emblema Para Uma Esquadrilha Assassina, 1967

Sun Photo as Self-Portrait, 1968

É nesse momento que surge, de outro lado, uma outra série muito singular do artista, completamente oposta à produção político-pop dessa mesma década. Dias dá início a uma série de trabalhos gráficos, minimalistas, em sua maioria valendo-se apenas do preto e branco, sem figuras e com escrita. É quase como se pendularmente tivesse oscilado para o pólo contrário do corpo de trabalho desenvolvido até ali, experimentando com seriações, instruções, grafismos, etc. Ainda produzindo sobre tela, o artista criou “Anywhere is my land”, cujo título afirma o não lugar do imigrante exilado, perseguido; “Sun Photo as Self-Portrait”, que ironiza o gênero do autorretrato com uma imagem cósmica; e “AlphaOmega Biography”, na qual paraleliza o micro e o macrocosmo, o universo e o indivíduo.

AlphaOmega Biography, 1968
Anywhere is my Land, 1968

Esse conjunto parece atípico em um primeiro olhar, mas é um fiel retrato do processo de pesquisa de Dias. No início, próximo da barbárie, seus trabalhos refletiam literalmente as imagens de violência. Depois, no exílio, a distância se materializava nessas pinturas de grande dimensão, nas quais a perspectiva é posta em um lugar de afastamento, de “big picture” – de olhar para o grande esquema das coisas, buscando encontrar seu lugar no mundo.

Você também pode gostar

© 2024 Artequeacontece Vendas, Divulgação e Eventos Artísticos Ltda.
CNPJ 29.793.747/0001-26 | I.E. 119.097.190.118 | C.C.M. 5.907.185-0

Desenvolvido por heyo.com.br

Page Reader Press Enter to Read Page Content Out Loud Press Enter to Pause or Restart Reading Page Content Out Loud Press Enter to Stop Reading Page Content Out Loud Screen Reader Support