Projeto traz obras de Cinthia Marcelle, Igi Lola Ayedun, Lenora de Barros e mais para o Rio Pinheiros

Exposição “Águas Abertas” apresentará em abril de 2025 intersecções entre arte, meio ambiente e cidade, ocupando os 8km do Parque Bruno Covas

por Giovana Nacca
6 minuto(s)
Paula Alzugaray e Gabriela de Matos. Créditos: Paulo D’Alessandro

Entre 7 e 22 de dezembro, a exposição Águas Abertas realiza sua abertura de processo no Parque Linear Bruno Covas, trazendo em primeira mão os projetos que se tornarão proposições artísticas às margens do Rio Pinheiros entre 4 de abril e 20 de julho de 2025.

Com curadoria de Gabriela de Matos e Paula Alzugaray e curadoria adjunta de João Paulo Quintella e Raphael Bento, a iniciativa busca mostrar intersecções entre arte, meio ambiente e cidade, ocupando o Parque Bruno Covas, na margem oeste do rio Pinheiros, entre a Ponte Cidade Jardim e o projeto Pomar Urbano em São Paulo. O objetivo é atrair novos públicos ao Parque e marcar as conquistas graduais do programa de despoluição do rio, que vem sendo executado desde 2019 pela Sabesp, patrocinadora do Águas Abertas. A identidade visual é de Namibia Chroma.

Nas palavras das curadoras, “Contrapor-se à tensão dialética entre natureza e cultura, que estruturou o pensamento antropocêntrico ocidental, e deixou como legado a crise climática extrema, é um movimento necessário em um presente de urgências. […] O projeto busca criar uma rede de canais navegáveis por discussões em curso; considerar como um rio e uma cidade podem sair modificados de um projeto que se propõe um laboratório de pensamento e imaginação, tendo a arte como agente; imaginar a terceira margem do Rio Pinheiros.”

Nessa primeira fase, serão exibidos desenhos técnicos, maquetes, fotografias, textos e fotocolagens que antecipam as sete instalações a serem realizadas nas margens e leito do Rio Pinheiros em abril do ano que vem, assinadas por Cinthia Marcelle + vão, Coletivo Coletores, Day Rodrigues, Igi Lola Ayedun + Metro, Keila-Sankofa, Lenora de Barros e Lúcio Ventania. Aspectos de gênero, etnia e cidade/bairro de origem foram considerados para a seleção de artistas, contemplando a diversidade. Encabeçada por duas curadoras, a seleção privilegiou artistas mulheres, subvertendo a tradição de construção de monumentos públicos simbólicos do patriarcado, fosse por seus realizadores ou por seus retratados masculinos.

Completa a abertura de processo uma maquete de grandes dimensões com a topografia do Parque Linear Bruno Covas pelo escritório de arquitetura UNA, de Fernanda Barbara e Fabio Valentim, assessores técnicos de Águas Abertas.

Águas Abertas tem patrocínio da Sabesp por meio da Lei de Incentivo à Cultura – Lei Rouanet, com realização do Ministério da Cultura e do Governo Federal.

Projeto Igi Lola Ayedun. Divulgação

Confira sobre os projetos:

Acerca de | Cinthia Marcelle + vão: Um muro de 10,5 m de comprimento é implantado na margem do Rio Pinheiros, vedando parcialmente a visão dos ciclistas e pedestres que frequentam o parque. Nele, estão acoplados outros sistemas de controle e segregação (lanças, gradis, cercas elétricas e concertinas) somando 4,5 m de altura. Lentamente, o muro começa a se mover, percorrendo, através de um trilho de 30 m de extensão, a borda do rio retificado. Ao chegar no fim da linha, o objeto inicia seu retorno ao ponto de partida, constituindo um movimento contínuo. E assim sucessivamente.

Anamnesis – PI-IÊRÊ | Coletivo Coletores: O projeto macro é uma confluência entre memória e monumentalidade, desdobrando-se em dois módulos complementares. O primeiro, denominado Matriz Radicante, ergue-se como uma arquitetura insurgente, tecendo um memorial lúdico e conceitual que desvela as múltiplas camadas de apagamento da história e imaginação sobre o rio. Este módulo emerge das lembranças coletivas, insurgindo através de vozes e narrativas silenciadas. O segundo módulo, Borrar Fronteiras, consiste em uma intervenção urbana em escala monumental, que usa a palavra se apropria da estrutura da passarela de pedestres e ciclistas da Ponte Laguna. Esta intervenção propõe o desafio entre as fronteiras físicas e simbólicas a partir da “palavraimagem”, remixando a paisagem urbana, sugerindo novas formas de interação e coexistência. É uma tentativa de transcender as limitações impostas pelas estruturas já existentes no território, propondo um imaginário, onde passado, presente e futuro interagem dialogicamente.

O Rio Vive entre Nós | Day Rodrigues: A artista é entusiasta da produção audiovisual e de documentários como ferramentas de fabulações com utopia e prosperidade. Pensa no processo de construção de imagens, som e edição como uma pedagogia do olhar com amorosidade, contra os sistemas de poder que empobrecem as vidas dissidentes e com o protagonismo de mulheres negras. Tal pesquisa soma-se à sua aprendizagem enquanto Ekedy d’Oyá, no candomblé de nação ketu. As folhas, os rios, as matas, o vento, a chuva e os orixás são fundamentais ao seu trabalho criativo e de costura em seu corpo-memória. O vídeo é um encontro entre o sagrado, narrado pela presença de uma atriz – mulher negra e mítica, detentora de sonhos e forças espirituais -, com uma personagem “real”, da comunidade dos arredores do Rio Pinheiros. A construção de um oratório à margem e takes de uma procissão ancestral entre cores e neon, fazem do filme uma oferenda para a ocupação possível, para humanos, nesse importante rio-território.

IOA | Igi Lola Ayedun + Metro: IOA é uma obra de arquitetura flutuante, concebida por Igi Lola Ayedun em colaboração com  METRO Arquitetos, A obra opera na intersecção entre arte e arquitetura, para além do espaço contemplativo. O pavilhão se propõe como um lugar de convivência experiencial, onde diversas expressões artísticas podem ser vivenciadas de forma imersiva. O uso de materiais sustentáveis reforça o compromisso com o meio ambiente, enquanto a estrutura se torna um monumento à regeneração e à inovação. Um projeto que transcende sua função utilitária para se transformar em uma manifestação poética e crítica sobre a relação entre o humano, a cidade e a natureza. 

Um Monte de Águas Chamado Pinheiros (nome provisório) | Keila-Sankofa: A população Pankararu habita as beiras do Pinheiros décadas antes das vias urbanas, e sabem histórias sobre este “montueiro” de água. Os povos tradicionais reconhecem o rio como um ponto de encontro, onde está o que é importante, água e comida, logo, é essencial construir sua moradia o mais próximo possível. O Rio Pinheiros é um rio de promessas e investimentos do capital, que carrega em sua suposta vida a desesperança, um corpo doente que não consegue respirar sozinho por sua solidão dentro da bacia do qual faz parte. Keila-Sankofa traz como proposta a realização de ativações para descobrir mais sobre o rio, a partir de entrevistas gravadas com os Pankararus residentes ao redor, que se desdobram em performance, intervenção no espaço do Parque Linear Bruno Covas com imagens e degradação de materialidades. Esses erros e acertos são registrados em um curta sobre as memórias e poéticas que, assim como os Pankararus, ainda teimam e permanecem vivos sobre o rio.

Resetar | Lenora de Barros: O verbo resetar, uma espécie de neologismo incorporado ao português contemporâneo a partir do inglês reset, remete a ideias como reiniciar, restaurar, recolocar ou alterar algo de maneira profunda, trazendo-o de volta ao seu estado inicial ou transformando-o completamente. Inspirada por esse conceito, Lenora de Barros concebeu a instalação poética RESETAR, apresentada na exposição Águas Abertas. A obra é composta por um “totem”, uma base cilíndrica equipada com setas de sinalização giratórias (360 graus), cada uma delas exibindo palavras formadas pelo prefixo RE, criando um vocabulário que sugere ações de reflexão e transformação. Esse conjunto simbólico convida os frequentadores do Parque Linear Bruno Covas a pensar sobre a condição atual do Rio Pinheiros e seu entorno, e a imaginar possibilidades de renovação e intervenção. O prefixo RE traz consigo a ideia de retorno e renovação, evocando o ato de recomeçar ou ressignificar algo que foi destruído ou perdido com o tempo. Esse é o núcleo conceitual da obra, que sugere um movimento cíclico de reflexão e mudança. Como parte de RESETAR, a artista também apresentará uma peça sonora desenvolvida em colaboração com o músico Cid Campos. Essa performance vocal, criada a partir das palavras que integram a obra, estará acessível por meio de um QR Code disponível na instalação, ampliando e aprofundando os sentidos propostos.

SOS | Lúcio Ventania: Construída em bambu, a obra é iluminada por refletores com placas fotovoltaicas, simbolizando a importância do uso de energia renovável, o poder da luz e dessa planta milenar como solução sustentável no caos ambiental. Flutuará no rio, símbolo da necessidade de despoluição e revitalização urbana, um alerta de que o futuro depende de nossas escolhas agora. O acrônimo SOS – do inglês Save Our Souls, ou “salve nossas almas” – vem do Código Morse e sinaliza pedidos de socorro, formando um ambigrama, que pode ser lido da mesma maneira em qualquer ângulo, invertido ou da direita para a esquerda. Isso reforça que a mensagem de socorro é nítida em qualquer contexto e para qualquer pessoa. Enquanto a obra evoca a urgência por mudanças nos sistemas de saneamento básico urbano que respeitem a preservação de nascentes e os cursos d’água, o bambu representa a resposta: um recurso natural renovável e acessível que aponta para um futuro harmônico entre ser humano e meio ambiente.

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