A land art agride o meio ambiente?

O que dizem alguns pesquisadores sobre o pensamento ético que deve nortear o processo de artistas que trabalham com a land art e que, portanto, promovem modificações na natureza

por Jamyle Rkain
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Robert Smithson, Broken Circle, 1971. FOTO: Retis

Quando falamos de Land Art, há sempre uma preocupação grande e justa em torno dos impactos que a produção das obras podem causas no espaço nas quais são construídas. Como vimos anteriormente no artigo Afinal, o que é a chamada “land art”? As obras que são criadas a partir desse movimento se diferenciam por não serem objetos colocados na paisagem, mas sim por terem a paisagem como o meio de criação. Assim, os trabalhos são a fusão da paisagem com a ideia do artista.

Quando surgiu, o movimento veio pautado por um pensamento ecológico, um ativismo ambientalista, bastante relevante, com o objetivo de fazer com que as pessoas, que naquele momento estavam muito atraídas pelo processo de industrialização e as novidades que ele trazia, voltassem sua atenção para a importância de preservar o meio ambiente e não esquecer o quanto a natureza é essencial para a manutenção da Vida. Assim, grande parte das obras realizadas por esses artistas foram feitas em espaços que já tinham sido degradados por alguma ação no passar dos anos e buscaram fazer com que o público olhasse para esses espaços.

Nancy Holt, Up and Under, 1987-98. 


De lá pra cá, muita coisa foi se modificando, progredindo, avançando. Junto a isso, o pensamento ambientalista, especialmente com o agravamento do aquecimento global no planeta, gerando bastante apreensão e demandando cuidados maiores. Assim, passamos a olhar com mais atenção para ações coletivas e individuais que destroem o meio ambiente e contribuem para o agravamento dos processos de mudanças climáticas e de extinções de fauna e flora, por exemplo.

Com isso, começaram a aparecer críticos da Land Art que defendiam uma avaliação mais acurada sobre os impactos de as obras causaram no meio nas quais eram construídas, ponderando um valor estético e principalmente ético das ações. De acordo com a pesquisadora Sheila Lintott, no artigo Ethically Evaluating Land Art: Is It Worth It?, “críticos da land art afirmam que é antiético por usar a natureza sem que tal uso seja justificado por algum bem futuro”. No texto, a autora aborda não só a ética no que diz respeito à agressão direta à natureza que alguns trabalhos poderiam causar, mas também aponta como alguns críticos situam que land art prejudica esteticamente a natureza com a modificação da paisagem. Ao avaliar o texto de Lintott, o professor John Andrew Fisher, da Universidade do Colorado Boulder, afirma em Is It Worth It? Lintott and Ethically Evaluating Environmental Art que a natureza “tem uma reivindicação moral sobre nós”, por isso, as obras também têm que possuir um conteúdo moral inerente.

Robert Smithson, “Spiral Jetty”

A historiadora da arte Amanda Boetzkes publicou em 2010 o livro The Ethics of Earth Art, onde considera um panorama do movimento desde a sua criação e aponta que os artistas envolvidos, como Robert Smithson, Ana Mendieta, James Turrell, teriam desde sempre uma preocupação ética em relação a seus trabalhos. Ela pontua que os artistas “assumem uma postura ética que se opõe tanto à visão instrumental que busca dominar a natureza quanto à visão romântica que postula um retorno a um estado mítico de liberdade com a natureza”.

O que dizem críticos?

Em artigo publicado em uma plataforma da University do Texas, Draven Schoberg e Scott R. Stroud fazem um estudo de caso no qual apresentam constrastes de discussões que ocorrem dentro da comunidade da land art. Dentre os membros desta comunidade, “muitos veriam a degradação e perturbação relativamente menores causadas pelas obras como um pequeno preço a pagar para chocar ou alertar o público sobre os danos ambientais que nossos modos de vida criam”.

Já outros afirmam que “independentemente da intenção e objetivos, o dano ao meio ambiente essencial para a realização dessas obras não pode ser negligenciado”. Para esses últimos, existem outras formas de se defender o movimento ao qual estão engajados “sem que suas obras de arte se tornem a causa do dano ambiental ou negligência que eles criticam”.

Christo e Jeanne-Claude, Surrounded Islands 

Em 2015, um artigo na revista online VICE buscou pontuar que os artistas que trabalham com land art não buscam apenas modificar as paisagens, mas têm em si um objetivo maior que é o de compreendê-las. Nele, o autor Adam Rothstein traz opiniões dos pesquisadores Lucy Lippard e de Robert Louis Chianese, dois críticos do movimento.

Chianese aponta algumas contradições tendo como exemplo a obra Spiral Jetty, de Smithson, declarando que existe “pouca consciência ambiental” neste trabalho: “É inerte e bastante monótono, isolado, um tanto elegante em sua simplicidade contundente, mas essencialmente sem sentido, embora de alguma forma humanize o local remoto e desolado”, finaliza.

Já Lippard, em seu livro Undermining : A Wild Ride Through Land Use, Politics, and Art in the Changing West, vai mais além, não se atendo apenas à questão ambiental, e critica a land art por considerar que muitas vezes ela é colonizadora, sendo “uma arte pseudo rural feita a partir de sedes metropolitanas”, comparando-a inclusive às atividades extrativistas de mineradoras.

Esses são alguns pontos levantados em uma discussão que pode ser bastante desconfortável, apontando contradições e necessidades de se refletir sobre nossos valores éticos, e está muito longe de ser encerradas. Afinal, ela possui desdobramentos. Mas é uma das discussões para o cenário da arte, contribuindo muito para pensarmos questões que são bastante urgentes.

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