Obra de Leiko Ikemura – Divulgação Lisson Gallery
A Lisson apresenta a primeira exposição de Leiko Ikemura na galeria, reunindo muitos dos temas presentes em sua obra ao longo dos últimos 30 anos. A mostra apresenta uma ampla variedade de mídias, desde pinturas em têmpera até esculturas em bronze e formas em vidro. A instalação se organiza em torno de uma figura central com três metros e meio de altura, meio mulher, meio coelho, intitulada Usagi Janus (2025). Essa escultura modelada e patinada à mão encarna um espírito protetor — parte coelhinha, parte bodhisattva da compaixão — que oferece refúgio do mundo exterior em seu corpo em forma de cone. Pequenas perfurações em sua saia maternal projetam um universo interno de estrelas. Com dois rostos — um voltado para frente, outro para trás — a gigante faz referência aos múltiplos alter egos e avatares que percorrem a obra de Ikemura, alguns dos quais podem ser vistos nas pequenas peças em bronze e nas cabeças de cristal. A figura de duas faces representa menos uma dicotomia e mais um estado de entremundos — uma condição que a artista investiga por meio de suas criaturas e objetos antropomórficos, ou nos espaços que não habitam nem a luz nem a escuridão, nem o bem nem o mal, mas sim um crepúsculo de incerteza.
O Usagi é um motivo recorrente que Ikemura associa a um jogo de infância: encontrar, na superfície da lua, os contornos sombreados de um coelho. A figura surgiu em sua prática após o terremoto de Tōhoku e o desastre nuclear de Fukushima, em 2011. Ao testemunhar à distância a devastação sofrida pela população japonesa e pelos habitats naturais — incluindo casos de malformações em animais —, a artista concebeu esse ser mítico como um mensageiro dos kami (deuses) e como recipiente para o sofrimento, a resiliência e a renovação universais. Um precursor dessa figura pode ser visto em Hasen-Frau (Mulher-Lebre), escultura em bronze de 1990, que revela como essas criaturas de Ikemura vêm atravessando e sobrevivendo às décadas. O título em alemão também indica sua decisão, relativamente precoce na carreira, de viver e produzir na Europa.
Emoldurando a forma quase sagrada de Usagi Janus, há um trio de paisagens fantásticas que evocam um cenário bucólico e florestal — talvez uma imagem das próprias origens da vida na Terra. Entre montanhas e pastos arborizados, surgem figuras deitadas ou rostos ocultos, ora fundidos com a terra, ora à espreita em aparições esqueléticas ou com feições de caveira. Em um de seus poemas, intitulado Transfiguração, Ikemura escreve: “Eu vi / tudo muda / pessoas viram pedras / montanhas / oceanos.” Uma figura em repouso também aparece de maneira vívida em Sleeping Figure in Red (1997/2012), onde uma jovem está de bruços, com a cabeça apoiada nas mãos — talvez em sofrimento, ou, como o título sugere, em descanso.
O elenco recorrente de meninas jovens na obra de Ikemura aparece aqui em diferentes posturas: deitadas, altivas, flutuando, chorando, rindo. Um duo de Brave Girls (2022) — uma em rosa com um gato, outra em laranja com véu de noiva — acompanha uma terceira, Pièta in Cherry Red (2024), que também carrega um gato ou bebê nos braços, com um par de olhos hipnotizantes que encaram diretamente o espectador. Simultaneamente poderosas e confrontadoras, mas também vulneráveis e ingênuas, essas adolescentes ferozes expressam uma tensão sutil entre extremos. Os pigmentos, impregnados na juta crua, irradiam uma presença intensa e incandescente. Sejam como retratos psicológicos de estados de espírito ou como seres híbridos e alternativos, essas obras singulares de Ikemura compõem um impressionante exercício de construção de mundo e permanência.
© 2024 Artequeacontece Vendas, Divulgação e Eventos Artísticos Ltda.
CNPJ 29.793.747/0001-26 | I.E. 119.097.190.118 | C.C.M. 5.907.185-0
Desenvolvido por heyo.com.br