Obras de Frida Kahlo desaparecem e ex-diretora denuncia gestão do museu

Entre obras vendidas ilegalmente, denúncia expõe falhas estruturais na proteção da artista mexicana

por Diretor
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Frida Kahlo, “Congresso dos Povos pela Paz”, 1952. Via Sotheby’s

A denúncia feita por Hilda Trujillo, ex-diretora dos museus Frida Kahlo (Casa Azul) e Diego Rivera Anahuacalli, escancarou uma grave crise envolvendo o desaparecimento de obras da emblemática artista mexicana. Segundo ela, pelo menos dez obras de Kahlo – incluindo os quadros Frida em Chamas (1954) e Congresso dos Povos pela Paz (1952), além de oito desenhos – teriam sido retiradas de maneira irregular do acervo e comercializadas sem autorização. A denúncia também aponta o sumiço de 12 páginas do diário original de Frida, documentos de valor histórico e simbólico irreparável.

As acusações ganharam corpo com a identificação de obras supostamente desviadas em leilões internacionais e coleções privadas. Congresso dos Povos pela Paz (1952), por exemplo, teria sido vendido em 2023 por US$ 2,6 milhões na Sotheby’s, segundo revelou Trujillo em entrevista ao canal mexicano Milenio. A ex-diretora afirma ter reunido provas como registros fotográficos e documentos oficiais que atestam a origem pública das obras e sua vinculação ao testamento de Rivera.

Além do desaparecimento das peças, Trujillo denunciou uma série de irregularidades na gestão das instituições após sua saída, incluindo a contratação de funcionários sem qualificação específica para áreas de preservação, curadoria e museologia. Ela também alerta para a fragilidade na fiscalização de negociações envolvendo obras com status de patrimônio nacional.

Em nota, o Instituto Nacional de Belas Artes e Literatura (INBAL) declarou que não autorizou nenhuma exportação definitiva das obras mencionadas e recomendou que a denúncia seja formalizada por vias legais. Até o momento, não há esclarecimento oficial sobre o paradeiro das obras, nem sobre as possíveis irregularidades que facilitaram a movimentação ilegal das obras.

Fachada do Museu Frida Kahlo. Imagem/Reprodução Museu Frida Kahlo

A denúncia de Trujillo se insere em um contexto mais amplo de lacunas na preservação da obra de Kahlo. Em julho de 2024, o jornal britânico The Times publicou uma reportagem detalhada sobre o misterioso desaparecimento de The Wounded Table (La Mesa Herida), uma das obras mais enigmáticas de Frida Kahlo. A pintura foi exibida pela primeira vez em 1940, na Exposição Internacional de Surrealismo na Galería de Arte Mexicano, na Cidade do México, e participou de outras mostras internacionais antes de ser doada por Kahlo à União Soviética em 1943. No entanto, por conta de sua estética surrealista, considerada incompatível com os princípios do realismo socialista, The Wounded Table nunca chegou a ser exibida publicamente em nenhuma das repúblicas soviéticas. Sua última aparição registrada ocorreu em Varsóvia, na Polônia, em 1955. Desde então, historiadores da arte e entusiastas têm procurado a pintura, mas apenas falsificações foram encontradas.

Ainda de acordo com a mesma reportagem, cerca de 300 obras foram produzidas por Frida Kahlo durante sua vida. Mais da metade dessas obras estão desaparecidas, foram destruídas ou estão em coleções privadas cujos proprietários se recusam a emprestá-las para exposições – o que contribui para tornar sua obra cada vez mais fragmentada e vulnerável.

A ausência de repercussão internacional no caso atual, por enquanto, apenas amplia o sentimento de impunidade e opacidade em torno de uma artista cuja obra representa um pilar da identidade cultural latino-americana.

Diante do escândalo, a reivindicação de Hilda Trujillo é clara: transparência, apuração rigorosa e proteção efetiva ao legado de Frida Kahlo. Em um país onde o patrimônio cultural segue vulnerável à negligência e à corrupção institucional, o caso reacende o debate sobre responsabilidade pública e a atenção urgente para políticas de preservação à altura do valor simbólico de artistas como Kahlo.

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