Um dos esforços recentes da história da arte é resgatar e dar o devido lugar a mulheres artistas que produziram obras relevantes ao longo dos séculos passados, mas foram – por motivos diversos – deixadas de lado da narrativa oficial sobre a produção artística de determinados períodos. No entanto, a cada nova pesquisa descobrimos também tendências e movimentos inéditos, como o que misturava espiritualidade e arte no final do século XIX e início do século XX. O ARTEQUEACONTECE selecionou 4 artistas que se inserem nesse movimento que todo mundo precisa conhecer.
1. Hilma Af Klint
Hilma Af Klint é hoje, provavelmente, o nome mais conhecido dentre essas mulheres, resultado de um trabalho de pesquisa e divulgação de seu trabalho que se iniciou nos anos 1980 e ganhou força a partir de 2013, com a grande mostra realizada no Moderna Museet, em Estocolmo, Suécia. Ela foi pioneira na virada da figuração para a abstração, mesmo antes de Kandinsky. Desde a década de 1870 Klint frequentava sessões de espiritismo na tentativa de se comunicar com os mortos. A artista interessava-se por uma dimensão que não a nossa realidade concreta, acreditando na existência de um mundo espiritual. No final do século, junto a quatro outras mulheres, formou o grupo “De Fem” [As Cinco], que se reunia toda sexta feira para sessões mediúnicas. A artista escreve que entrava em contato com “Mestres Superiores”, que lhe diziam o que fazer, como pintar, o que dizer, etc. Toda sua extensa obra é marcada por simbolismos e linguagens próprias, repetição de signos e frequentes alusões às dimensões alternativas. Sua obra máxima foi o conjunto de obras intitulado “Pinturas do Templo”, realizado entre 1906 e 1915, composto por 193 pinturas divididas em séries.
2. Georgiana Houghton
Georgiana Houghton nasceu em 1814, nas Ilhas Canárias, mas mudou-se anos depois para Londres. A artista também frequentava sessões espíritas, e desenvolvia suas habilidades mediúnicas desde 1859. Sua primeira obra realizada a partir deste trabalho espiritual foi realizada em 1861: um desenho. Pelos anos seguintes, Houghton continuou a produzir aquarelas e desenhos guiada pelo espírito chamado “Henry Lenny and 70 Archangels”, criando mais de 150 trabalhos extraordinários. Sua criação tinha o mesmo método dos desenhos automáticos ou das experiências cegas – a artista iniciava sem saber onde iria chegar. Usando cores vibrantes em formas abstratas espiraladas, Houghton acumulava camadas de traços em intrincadas redes e redemoinhos. A artista esforçou-se muito para exibir seus trabalhos ainda em vida – sozinha, organizou uma mostra individual na New British Gallery, em 1871, um fracasso de vendas e com críticas ambivalentes. Ademais, Georgiana foi ignorada pelos historiadores mesmo apesar do pioneirismo de seu corpo de trabalho, que também antecedeu a abstração de Kandinsky e Malevich por muitos anos.
3. Agnes Pelton
Agnes Pelton nasceu na Alemanha, em 1881, mas mudou-se para os Estados Unidos ainda na infância, em 1888. Estudou no prestigiado Pratt Institute onde foi encorajada a não imitar a realidade ou seguir padrões acadêmicos, mas sim a experimentar, inclusive com a abstração. Devido a problemas de saúde, passou alguns anos sem pintar. Mas, em 1907, retomou a produção artística, estudando o comportamento e os efeitos da luz. Estudou na Itália, voltou a Nova York, e então passou a desenvolver o que chamou de “Imaginative paintings”, ou pinturas imaginativas. As imagens representavam figuras femininas meditativas, em paisagens bucólicas – duas dessas obras inclusive foram apresentadas no Armory Show de 1913. Em 1921, vivendo em Long Island, sobrevivia pintando retratos – porém, acreditava que não apenas estava reproduzindo a realidade física, mas impunha-se o desafio de registrar o espírito de seus retratados. Suas primeiras abstrações foram produzidas em 1926, baseadas em movimentos de água, ar, luz e estrelas. Dez anos depois, mudou-se para o deserto da Califórnia, onde continuou a explorar os contrastes e os simbolismos dos elementos naturais – água e ar, quente e frio. Em 1938, Raymond Jonson fundou o “Transcendental Painting Group”, ou Grupo de Pintura Transcendental, no Novo México, e Agnes Pelton tornou-se a primeira presidente do coletivo, servindo como uma espécie de mentora para os outros membros. Pelton também não recebeu o devido reconhecimento da história da arte em vida, mas hoje tem sido crescentemente pesquisada e celebrada.
4. Emma Kunz
De uma geração um pouco mais jovem que Klint, Emma Kunz foi uma artista e curandeira que viveu entre 1892 e 1963, na Suíça. Kunz se autodenominava uma pesquisadora, mas era reconhecida como alguém com capacidade de curar e ajudar pessoas. Hoje seu trabalho artístico vem ganhando reconhecimento crescente, inclusive com a exposição que acaba de abrir na Serpentine Gallery, em Londres. Aos 18 anos, Kunz começou a usar suas habilidades telepáticas e a proferir profecias, utilizando também um pêndulo para adivinhar o futuro. Ficou famosa por seus tratamentos e pelos conselhos que dava, chegando a ser chamada de milagrosa. A artista produzia grandes padrões gráficos sobre papel. Seus trabalhos eram formas geométricas que reproduziam ritmo e vibração, marcados por simbolismo e transformação da figura em medida, princípio, ordem. Kunz deixou um legado de mais de 400 desenhos, e parte desta coleção hoje permanece exposta no Emma Kunz Zentrum, em Würenlos, Suíça.