Agnaldo Manuel do Santos ganha livro e exposição na galeria Almeida e Dale

Entre referências africanas e a convivência com a elite branca do modernismo, escultor baiano conquistou uma poética própria e potente

Tempo de leitura estimado: 3 minutos
Agnaldo Manuel do Santos
Agnaldo Manuel do Santos – A Conquista da Modernidade

Infelizmente são frequentes os reducionismos no mercado de arte. A complexidade e potência de muitos artistas são reduzidas pela falta de informação ou simples preconceito. Foi o que aconteceu com o artista baiano Agnaldo Manuel dos Santos, cuja obra por muitos anos foi analisada como “fruto do inconsciente, associado à sua ancestralidade”. A curadora Juliana Bevilacqua, entretanto, passou os últimos 8 anos estudando o trabalho do artista para reverter essa história. 

Agnaldo Manuel do Santos
Agnaldo Manuel do Santos

A negligência em relação ao artista e seu trabalho é resultado, de acordo com a autora, de alguns fatores: além da morte prematura, aos 35 anos, Agnaldo sofreu racismo pela cor de sua pele, origem humilde e falta de educação formal. Ele nasceu na Ilha de Itaparica e aos 21 anos mudou-se para Salvador onde acabou tornando-se assistente de Mário Cravo Júnior. Seis anos depois começa sua curta e intensa carreira como escultor, trabalhando essencialmente com madeira. Ao ler Agnaldo Manuel do Santos – A Conquista da Modernidade, um belíssimo livro publicado pela galeria Almeida e Dale Galeria de Arte, você irá notar que ele foi um dos poucos artistas aquele perfil racial e socioeconômico a se relacionar diretamente com a elite intelectual e artística que explorou e difundiu o modernismo no Brasil.  No entanto, o lugar reservado para ele não era o mesmo dos seus colegas.

Agnaldo Manuel do Santos
Agnaldo Manuel do Santos

Em muitos momentos, porém, a modernidade associada ao seu trabalho era comparada à modernidade africana: o crítico, mediador cultural e professor alemão Ulli Beier (1922-2011), em viagem ao Brasil em 1962, entrevistou Agnaldo e, um ano depois, publicou um texto sobre o escultor ressaltando “a mistura certa de impulso modernista e antiacadêmico e uma tradução afável de formas e conceitos indígenas”, como descreveu o artista ibo-nigeriano Chika Okeke-Agulu. 

Agnaldo era um artista atento ao mundo à sua volta. Visitou exposições, estudou escultura tradicional africana e escultura moderna. Conviveu, trocou e dialogou com outros artistas, inclusive os ditos “populares”, que conheceu nas ruas de Salvador, no ateliê de Cravo Júnior e nas galerias que frequentava. Participou de viagens de coletas de ex-votos e santos católicos com outros artistas da Bahia, encontrou um dos seus mestres no rio São Francisco e com ele aprendeu sobre escultura e sobre carrancas. Em 1957, ao dar-se havia perdido o prazo para enviar suas obras para participar da IV Bienal de São Paulo, escreveu de próprio punho uma carta para o então secretário Arturo Profili pedindo uma nova oportunidade, que não apenas lhe foi concedida como também lhe rendeu um prêmio de escultura. 

Agnaldo Manuel do Santos
Agnaldo Manuel do Santos

Sua produção, entretanto, tem sido reduzida até hoje a interpretações vinculadas a uma conexão profunda com a África por meio do inconsciente e do atavismo – sempre negando que ele a tenha estudado. O livro chega, enfim, para reverter essa imagem e mostrar  como artista que subverteu a modernidade que lhe foi consentida não se rendendo nem se limitando àquilo que era esperado de um artista negro vivendo na Bahia da década de 1950. 

Agnaldo Manuel do Santos
Agnaldo Manuel do Santos

A publicação é ricamente ilustrada com as esculturas do artista e é dividida em XX capítulos escritos pela autora: Entre santos e ex-votos; O universo das carrancas; A África de Agnaldo; Sobre gente e afeto; e, Esculpindo uma trajetória ( uma linha do tempo que inclui imagens da carta enviada à Bienal de São Paulo). Conta, ainda, com um texto de Roberto Conduru e outro de Thais Darzé. O lançamento da obra coincide com uma exposição dedicada ao artista na galeria Almeida e Dale. 

Agnaldo Manuel do Santos – A Conquista da Modernidade

Data: Até 11 de dezembro

Local:  Almeida & Dale Galeria de ArteEndereço: R. Caconde, 152 – Jardim Paulista

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